As causas históricas da divisão sexual do trabalho e da representação política são antigas e complexas. Não é sem propósito, que mesmo as mulheres sendo a maioria da população e quase metade da classe trabalhadora, ainda recebem salários inferiores ao dos homens e ainda são minoria nos espaços de decisão, no âmbito legislativo, judiciário, executivo, nas hierarquias religiosa e militar e porque não dizer, nos espaços do mundo do trabalho.
Este passado milenar de exclusão e segregação, felizmente começou a sofrer fissuras no século XIX, com a Revolução Francesa, com o surgimento do movimento pelo direito ao voto no século XIX, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, com a entrada maciça das mulheres na educação e no mercado de trabalho, com a propagação do feminismo que colocou em xeque os valores tradicionais da família e da sexualidade e teve papel fundamental para o declínio do patriarcado e a transformação da sociedade no século XX. Esse movimento provocou questionamentos sobre os poderes e privilégios especiais de pais e maridos.
Sem dúvida as mulheres estiveram ombro a ombro com muitos homens na busca por uma sociedade sem discriminação e com igualdade de condições para o exercício pleno da cidadania sem preconceitos de gênero, geração, raça/etnia, orientação sexual e demais discriminações que tenham como base as diferenças construídas socialmente a partir da liberdade de escolha e do livre arbítrio.
Se é verdade que avançamos e garantimos conquistas nos diversos aspectos da sociedade no último século, também é verdade que neste último período, especialmente no período neo liberal, vimos sofrendo algumas derrotas, ou pior, retrocessos em relação a autonomia e liberdade de escolha – caso do aborto, em que, além da perseguição e tentativa de criminalização das mulheres que praticaram o aborto, surgem propostas como o da bolsa estupro, que surge como forma de descaracterizar o estupro como não violência. Além das diversas formas veladas ou não de discriminação e da retomada com força, do machismo travestido em todos os momentos e espaços da sociedade, a exemplo de propostas políticas que vêm se desenhando e que visam esse caminho.
Infelizmente o movimento sindical não está imune a tudo isso e reproduz quase que integralmente as mesmas formas presentes na sociedade. A luta cotidiana para romper com os maus hábitos de companheiros e companheiras nos deixa por muitas vezes sem chão e porque não dizer, desesperançadas. Mas, quando isso ocorre, nos reportamos às diversas lutas travadas pelas mulheres e no apoio e solidariedade que encontramos em valorosos companheiros homens. Exemplo disso tem sido a luta das mulheres no interior da CUT. Em um primeiro momento pela aprovação das cotas de gênero e em seguida pela sua implementação.
Sem dúvida, a batalha cotidiana, seja ela qual for, nos fortalece e também nos aponta para mais e mais desafios a serem superados. A nosso ver, superar desafios é construir medidas que se contraponham ao monopólio masculino, que rompam com as distorções nos espaços de representação e nos espaços de poder de maneira geral.
Não é aceitável a sub-representação das mulheres. A democracia para ser plena deve considerar a presença das mulheres. Enquanto a representatividade das mulheres nas instâncias de poder político do Brasil gira em torno de 10%, os países nórdicos já têm quase metade das vagas parlamentares ocupadas por mulheres, por exemplo. Segundo especialistas, quanto melhor o Índice de Desenvolvimento Humanos de um país, mais equilibrada é a participação das mulheres nos variados níveis de poder.
No movimento sindical mesmo com avanços nas últimas décadas e com uma maior participação das mulheres no número de sindicalizados, ainda é baixa a sua participação nos espaços de maior visibilidade. São necessárias medidas que visem incentivar a entrada e permanência delas no mercado de trabalho e consequentemente no movimento sindical, através das direções, mesas de negociação, espaços de formação e qualificação, entre outras.
A crise e o impacto para as mulheres
È neste contexto que se apresenta a crise econômica vigente. O que as mulheres têm a ver com isso? Muito! Devemos recordar que as mulheres ainda exercem os piores trabalhos, recebem salários menores, mesmo exercendo trabalho igual ao dos homens, encontram-se em sua maioria no trabalho informal e ainda são as responsáveis pelo trabalho doméstico e do cuidado, o que lhes proporciona a chamada "dupla jornada". Além disso, hoje 33% das famílias brasileiras são chefiadas por mulheres, que muitas vezes são obrigadas a trabalhar em mais de um emprego para garantir a subsistência dos filhos. São elas que em momentos de crise tornam-se mais vulneráveis aos desmandos do capital.
É importante tirarmos ensinamentos com a crise. Primeiro, devemos pensar em um outro modelo de desenvolvimento, onde o capital humano seja a prioridade e não o capital financeiro. Segundo, o fortalecimento do Estado como propulsor do desenvolvimento com distribuição de renda e investimento em políticas públicas que beneficiem toda a sociedade, como educação, responsabilidade com o cuidado, saúde, em especial a saúde integral da mulher, que tem a data do dia 28 de maio como dia mundial pela saúde da mulher e de combate a mortalidade materna, enfim, a construção de um Estado de Direito que garanta o bem estar da sociedade sem clientelismo e sem políticas compensatórias.
Além disso, é determinante que sejam viabilizadas políticas voltadas para o exercício do trabalho, com o objetivo de geração de emprego e renda com segurança e melhoria na qualidade de vida para o conjunto da classe trabalhadora. Exemplo disso é a redução da jornada de trabalho sem redução de salários, que gera emprego e melhora a qualidade de vida, além da apropriação do tempo livre pelos próprios trabalhadores/as e o fim da demissão imotivada, como forma de inibir a pressão do capital sobre o trabalho.
Enfim, a CUT deve em seu 10º CONCUT reafirmar sua política em defesa de uma sociedade justa, com garantia e ampliação de direitos para o conjunto da classe trabalhadora e dentro desta "classe" a igualdade sem distinção de sexo, raça/etnia, geração e orientação sexual. Uma igualdade que possibilite o caminho para um mundo com democracia plena, livre de preconceitos e onde as diferenças não sejam usadas para justificar as desigualdades. Enfim, uma sociedade verdadeiramente socialista, com espaço para a solidariedade e o respeito. Esse é o nosso sonho – "o sonho possível", afinal, "sonhar não custa nada" e o que mais causa medo aos poderosos é a nossa incansável capacidade de sonhar.