Clemente Lúcio, ex diretor técnico do Dieese e atual assessor das centrais sindicais, falou na última terça-feira (2) para todos os diretores da FUP durante a primeira reunião de planejamento da Federação em 2021. Clemente fez uma análise da conjuntura diante das mudanças na estrutura do mercado de trabalho e acendeu uma hipótese a ser considerada: a reinvenção do movimento sindical. Se há um novo mundo do trabalho, os protagonistas dessa transformação terão que ser capazes de representar categorias de trabalhadores que já estão sendo afetadas principalmente em três dimensões: com relação à proteção, à jornada e às condições de trabalho. Uma alteração histórica acontecerá e uma nova estrutura sindical surgirá para lidar com as novas formas de organização social.
Clemente traçou o perfil das principais mudanças que marcam os dias atuais e caracterizam as revoluções tecnológicas que estão a acontecer com significativas alterações nos padrões de produção de energia, comunicação e transporte. São áreas que já sofrem mudanças profundas com sistemas produtivos a operar de maneira ininterrupta, como a capacidade humana de produzir energia com ausência de limites, fenômeno visto também nas diversas possibilidades da comunicação com exemplo para as conexões feitas em tempo real e sem cabeamento e por último, identificado nas novas lógicas de transporte com a compra, produção e entrega de produtos a acontecer de forma simultânea.
Sendo assim, estamos diante de uma estrutura produtiva e social que morre gradativamente enquanto uma nova estrutura emerge. Onde as atividades humanas em potencial se transformam em atividades econômicas e as empresas passam a ter um novo papel, agora, orientadas para responder aos acionistas que são os novos tipos de proprietários a exigir uma estrutura produtiva baseada no máximo retorno no menor espaço de tempo. Foi a reestruturação da lógica produtiva e da distribuição do resultado das empresas que fez com que prevalecessem as estratégias de negócios de curtíssimo prazo e segundo Clemente, essa lógica vem sendo revista por quem a aclamou, já que acentuou um processo inimaginável de concentração de renda e distribuição da riqueza.
Haja vista para o debate mundial que volta a atenção para o tema da desigualdade social, um dos grandes elementos constitutivos de uma reflexão ética, estética e moral que recoloca o sentido da organização social e o sentido da disputa como um todo. “Inclusive o retrocesso civilizatório com a guinada à direita e o neofascismo predominando no mundo são as repostas que a sociedade começa a dar diante das transformações na propriedade do capital e na concentração de renda e riquezas onde a empresas passaram a ter um novo papel.”
Desde 2008, cerca de 140 países fizeram reformas trabalhistas idênticas à que aconteceu no Brasil, o que deu às empresas uma autonomia para demitir o contingente de trabalhadores que quisesse sem ter que ativar seus sindicatos, também aumentaram suas possibilidades de terceirização e flexibilizaram os contratos e jornadas de trabalho. Assim, os empresários conseguiram diminuir a proteção do estado sobre as condições de trabalho, e restringir os papeis dos sindicatos com um ataque sistêmico ao sindicalismo. Tudo, para fazer seguir uma tendência de negociações diretas entre empresa e trabalhadores sem a presença do sindicato.
Apesar da condição adversa que se encontra o Brasil e os brasileiros, onde a causa está na plataforma do governo atual que afeta a classe trabalhadora, é preciso inventar uma resposta sindical com força social capaz de pressionar um modelo regulatório de trabalho com outras formas de proteção. Se os novos vínculos laborais não se encaixam mais no assalariamento clássico nem segmentos de categorias, então, talvez seja necessária uma solidariedade capaz de reunir os trabalhadores dispersos alicerçada em uma macro organização e articulação onde se supere a fragmentação do mundo do trabalho diminuindo o fracionamento de bases de unicidades sindicais.
O local de moradia pode ser a base da organização para o futuro do movimento sindical. Pode ser a resposta positiva dos trabalhadores como elemento constitutivo de força política capaz de fazer o enfrentamento com relação à jornada de trabalho, à proteção laboral e à previdência e saúde do trabalhador. Para Clemente, a categoria petroleira carrega a enorme tarefa de defender as empresas estatais e finaliza sua fala afirmando ser imprescindível que no cotidiano da ação sindical se mantenha o plantar de sementes para o futuro, na forma de conceitos organizativos mais amplos a fim de operar a solidariedade necessária diante de tamanha desigualdade.