Após diversas reclamações formais e informais, a Refinaria de Paulínia (Replan) anunciou, finalmente, um plano de testagem para detectar possíveis contaminados pelo novo coronavírus. A maneira como está sendo colocado em prática, entretanto, demonstra a falta de diálogo da gerência.
A ideia é impor aos trabalhadores um deslocamento à refinaria durante o período de descanso, com seus veículos particulares, para realizarem testes rápidos de coronavírus por meio de um sistema drive thru, duas vezes por mês, até dois dias antes de recomeçarem um novo ciclo de trabalho.
Como a Replan – maior refinaria em capacidade de processamento do Sistema Petrobrás – está localizada no quilômetro 130 da Rodovia Professor Zeferino Vaz (SP-332), em Paulínia (SP), grande parte dos trabalhadores terão que arcar com os custos do transporte e pedágios, além de abdicarem de algumas horas dos seus dias de descanso.
Atualmente, cerca de 450 petroleiros, de um total de 976, continuam realizando suas atividades presencialmente. Grande parte é formada por profissionais que trabalham nas áreas operacionais da refinaria, conhecidos como trabalhadores do “turno”. Durante a pandemia, eles estão realizando jornadas de 12 horas, para evitar a troca constante de equipes. Com isso, trabalham três dias seguidos, folgam quatro, trabalham novamente três dias e folgam outros cinco. Os testes serão realizados dois dias antes do recomeço de um novo ciclo.
Esse foi o caso do técnico de operação e diretor do Sindipetro Unificado, Marcelo Garlipp. Nesta quarta-feira (3), o petroleiro se viu obrigado a sair de sua casa, em Campinas, para ir até a entrada sul da refinaria realizar o teste rápido, que demora entre 10 e 30 minutos para fornecer os resultados após a coleta.
“A Replan está acatando um pleito do sindicato e, mais do que isso, da própria Organização Mundial de Saúde, mas no meio da folga, que é um direito do trabalhador. Se o trabalhador é chamado pela empresa no meio da folga, isso já se constitui como trabalho. A empresa está escolhendo o caminho mais fácil para ela, e jogando todo o ônus no colo dos trabalhadores”, afirma Garlipp.
Além disso, o técnico de operação também aponta a necessidade de desmistificar essa iniciativa da empresa. Para ele, os testes são um direito da categoria petroleira, que está enquadrada como um serviço essencial e, por isso, não pode paralisar suas atividades.
“A empresa está cumprindo com atraso aquilo que o sindicato já havia indicado. Mas ela não está fazendo isso de boazinha, está fazendo para não arcar com possíveis consequências judiciais e para não ficar sem sua força de trabalho. A gente tem que quebrar a narrativa de que a empresa está fazendo uma benesse ao trabalhador”, opina Garlipp.
Falta de diálogo
A aplicação dos testes começou a ser feita na quinta-feira passada, 28 de maio. Muitos dos trabalhadores foram informados somente no dia anterior, quarta-feira (27), sobre o cronograma de testagem. De acordo com o coordenador regional do Sindipetro Unificado, Gustavo Marsaioli, isso demonstra a falta de diálogo da empresa com os trabalhadores.
“Desde o início da pandemia nós cobramos da gerência a necessidade de realização de testes rápidos. Mas a implementação dos testes foi feita de uma forma muito açodada e autoritária. A empresa ameaçou de impedir a entrada dos trabalhadores no próximo ciclo, caso não realizassem o teste”, explica Marsaioli.
De acordo com o dirigente sindical, o gerente de Relação Humanas (RH) garantiu que os casos de pessoas que não possuíam veículos particulares seriam avaliados, para que fossem disponibilizados transportes alternativos. “Eles disseram que essas situações seriam avaliadas individualmente. O que percebemos foi que as solicitações de trabalhadores grevistas e próximos aos sindicatos foram negadas”, denuncia.
Diante desse cenário, o Sindipetro Unificado realizou três reuniões setoriais online, que contou com a presença massiva dos petroleiros. A partir disso, surgiram duas propostas que foram encaminhadas à gerência e ao Comitê de Crise da Covid-19 da Replan.
A primeira alternativa é a antecipação da chegada dos ônibus dos petroleiros em uma hora, para a realização dos testes antes do início da jornada de trabalho. A segunda propõe a criação de pontos descentralizados de testagens nos principais municípios da região, como Paulínia, Americana, Campinas e Limeira, onde possuem residências a maioria dos trabalhadores.
O Sindipetro Unificado disponibilizou a sua sede, em Campinas, além de endereços de sindicatos parceiros, para abrigar esses centros de testagens. Entretanto, não houve resposta da empresa até o momento.
Na próxima semana, haverá uma nova rodada de reuniões setoriais para avaliar as medidas que serão tomadas a partir das sinalizações da Replan.
Testes rápidos
A Replan disponibilizará os testes rápidos do tipo IgM e IgG. Diferentemente do tipo RT-PCR, que identifica a presença do próprio vírus Sars-Cov-2 no organismo, os testes do tipo IgM/IgG conseguem reconhecer a contaminação por Covid-19 a partir de anticorpos.
As imunoglobulinas (Ig) são os anticorpos de defesa do organismo humano. O IgM é um tipo de anticorpo e a sua presença indica infecção de Covid-19 na fase ativa, ou seja, quando a pessoa foi contaminada recentemente pela doença. Nessa etapa, a pessoa é uma possível transmissora do vírus. Já o IgG é um anticorpo que aparece em uma fase já avançada da infecção. Nessa etapa, a pessoa contaminada já não transmite mais o vírus.
Apesar da Replan não divulgar o número de infectados, negando o direito de acesso à informação, o Sindipetro Unificado já tomou conhecimento de um petroleiro que testou positivo para coronavírus no teste do tipo RT-PCR, e três assintomáticos que testaram positivos nesses novos testes do tipo IgM/IgG.
[Via Sindipetro Unificado SP]