Moro aciona PGR para intervir na investigação que liga Bolsonaro ao assassinato da vereadora Marielle

 

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, enviou uma solicitação ao Ministério Público Federal (MPF) para que instaure inquérito para investigar as declarações de um porteiro de que um dos suspeitos do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, pediu autorização a Jair Bolsonaro para entrar no condomínio onde encontrou o outro suspeito.

Globo noticiou nesta terça-feira (29/20) que Élcio de Queiroz, um dos suspeitos da morte de Marielle, entrou no condomínio onde morava Ronie Lessa com a autorização de Bolsonaro. Isso teria sido no dia 14 de março de 2018, horas antes do assassinato. Acusado de fazer os disparos, Lessa morava no mesmo condomínio que o atual presidente da República.

Moro pede ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que o MPF e a Polícia Federal passem a atuar juntos na investigação do caso.

Clique aqui para ler o pedido. 

Para o advogado e professor de Direito Constitucional da PUC-SP, Pedro Serrano, a interferência de Moro e Bolsonaro na investigação é mais grave do que a citação do presidente no processo.

“Isso é muito mais grave do que o o fato de o porteiro tê-lo citado, porque para mim, pela primeira vez, além de crimes comuns, caso ele adote esta conduta, existe crime de responsabilidade, passível de impeachment. A conduta é gravíssima, dolosa, implica em obstaculizar investigação policial e utilizar a Polícia Federal para fins pessoais de defesa”, diz Serrano, em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, na Rádio Brasil Atual. Ele destaca que a mera cogitação de tomar a iniciativa não é crime, o que somente ocorreria em caso de efetivação da conduta.

O jurista destacou também o possível cometimento de crimes de responsabilidade pelo governador Wilson Witzel. Bolsonaro disse hoje pela manhã, em entrevista à Band News, que teria sido avisado há três semanas pelo governador do Rio de Janeiro sobre a citação ao seu nome no processo que investiga a morte da vereadora carioca Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes. Witzel teria contado isso durante um encontro casual no dia 9 de outubro, no Rio de Janeiro.

“Isso foi numa quarta-feira, há três ou quatro semanas, no Clube Naval, por volta das 21h. De repente ele chegou, se surpreendeu comigo. Ele achava que eu sabia da patifaria que estava acontecendo e foi conversar comigo no canto. ‘Teve um problema, citaram seu nome (no caso Marielle), a história está assim, nós já enviamos ao processo (ao STF)’. Nós quem? Nós quem cara pálida, é atribuição de quem?”, disse Bolsonaro.

Em entrevista concedida na manhã desta quarta-feira, Witzel negou. ‘Eu jamais vazei qualquer tipo de documento. Sequer tive acesso a documentos que constam dessa investigação. E se esse documento vazou, como foi apresentado ontem (terça) numa emissora de televisão, que a Polícia Federal investigue e tome as providências.”

“O governador cometeu um crime grave se isso for verdade. Incorrendo na Lei de Organizações criminosas, obstaculizou investigação, não se pode vazar informação sigilosa. E cometeu crime de responsabilidade. Sou contra o uso banalizado do impeachment, tenho artigos escritos sobre isso, acho que deve ser usado em situações de emergência, mas é incrível como há um despudor no Brasil no cometimento de condutas graves pelas autoridades nesse momento, de forma nunca antes vista em nossa história”, avalia Serrano.

“Não creio que o depoimento do presidente da República, no estado emocional em que está, seja confiável, mas, de qualquer forma, se isso ocorreu é muito grave. A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro tem que imediatamente instaurar um processo para verificar o cometimento de crime de responsabilidade pelo governador e o Ministério Público do Rio de Janeiro, creio que que o MPF tem que investigar.”

A inação das instituições

Serrano chama a atenção ainda para a falta de ação das instituições que deveriam defender a democracia. “Veja o quanto se cogitou, e por nada, que governos anteriores tivessem feito supostas obstaculizações de Justiça. Agora temos concreta e publicamente práticas de obstaculização de Justiça, práticas de organização criminosas no governo e nada se faz. Nossas instituições de fiscalização estão acovardadas. Parece que tem força e coragem quando tem apoio forte da mídia, na hora em que é preciso ter o mínimo de coragem para fazer o que eles são pagos para fazer, estão absolutamente inativos”, aponta. “A Constituição e a democracia sucumbindo, e as instituições que têm o dever de protegê-las não fazendo nada. Os crimes e condutas ilícitas são passados na cara das instituições e elas não fazem nada.”

Para o professor de Direito Constitucional, é preciso discutir o papel das carreiras que agem de forma parcial e seletiva. “Em um futuro governo democrático precisamos tratar dessa questão. Nós precisamos revisar a estrutura das carreiras jurídicas no Brasil, elas têm proteção constitucional e na hora que é necessário utilizá-las para realizar sua função, quando a democracia é ameaçada, não fazem nada. Não podem haver incrustadas no Estado carreiras com posição político-ideológica como estamos vendo. Que agem de forma seletiva, protegem a direita e atacam a esquerda. Isso é extremamente perigoso para qualquer governabilidade democrática”.

Veja a íntegra da entrevista:

[Com informações Conjur e da Rede Brasil Atual | Foto: Gabriela Bilo]