Por Eduardo Costa Pinto (*) e Cloviomar Cararine (**), integrantes do Grupo de Estudos Estratégicos e Propostas para o Setor de Óleo e Gás (GGEP)
A Petrobras divulgou, na última segunda-feira (13), o seu balanço do terceiro trimestre de 2017. Os principais veículos de comunicação destacaram a queda de 16% do lucro líquido de R$ 266 milhões neste período em relação ao anterior (R$ 316 milhões). Somente esse resultado esconde informações importantes que confirmam algumas impressões sobre o rumo estratégico da empresa.
Primeiro, verificou-se uma diminuição de 5,4% da dívida líquida frente ao segundo trimestre de 2017 (de R$ 295,3 bilhões para R$ 279,2 bilhões), o que permitiu uma nova queda da relação dívida/Ebitda, mesmo não ocorrendo a entrada de recursos oriundos da venda de ativos. Esse aspecto reforça a nossa hipótese de que uma redução do grau de endividamento da Petrobras não depende de um programa de desinvestimentos, como a gestão da Petrobras tem alegado há algum tempo[1].
Segundo, a queda no lucro bruto de 1% em relação ao trimestre anterior (de R$ 21,36 bilhões para R$ 21,23 bilhões), mesmo com crescimento da receita de 7% nesse período (R$ 66,9 bilhões para R$ 71,8 bilhões)[2], ocorreu em virtude do aumento de 11% dos custos dos produtos e serviços vendidos. Os itens que mais contribuíram para o crescimento dessa despesa foi: materiais, serviços, fretes, aluguéis e outros (contribuição de 40%). Isso pode ser explicado pela estratégia de ampliação das importações de máquinas e equipamentos adotada pela Petrobras. Esse resultado permite contestar se a maior permissividade à entrada de importações é efetivamente mais eficiente do ponto de vista econômico.
Além disso, ocorreu uma redução de 48% no lucro operacional (de R$ 15 bilhões para R$ 7,8 bilhões) em relação ao trimestre anterior em virtude do aumento de outras despesas, tais como o reconhecimento de provisão para contingências judiciais (R$ 1,5 bilhão) e da forte reversão da conta de alienação de bens, pois não foi realizada nenhuma venda de grandes ativos no terceiro trimestre.
Desse modo, pode-se questionar duas das principais diretrizes da atual gestão da Petrobras: i) a necessidade de vender ativos para reduzir o endividamento da estatal e, ii) as vantagens de uma maior exposição ao mercado internacional. Sobre o segundo ponto, o próprio diretor de relações com os investidores, Ivan Monteiro, justifica que esse resultado aquém do esperado foi fruto de “uma combinação de itens não recorrentes e uma perda de market share da empresa, que afetou suas margens”[1].
No entanto, os argumentos do diretor financeiro e de relações, embora ajude a explicar os resultados observados, não explicitam a relação de tais resultados com a estratégia adotada pela Petrobras.
Na verdade, a estratégia em curso da atual gestão combina a opção pela concentração de suas atividades na área de produção e exploração em detrimento do refino (fragmentação e desintegração vertical), a maior exposição ao mercado externo por meio do aumento dos fluxos de comércio e a ampliação da contratação de fornecedores internacionais (máquinas, equipamentos e insumos, afretamento, etc.). Isso amplia a exposição da empresa a variáveis que ela não controla, como câmbio e preço do petróleo, e reduz suas margens no segmento do refino.
Cabe destacar o resultado positivo da receita de vendas (7%) no terceiro trimestre de 2017, mesmo com a queda da produção de petróleo e gás entre o segundo e o terceiro trimestre de 2017 (de 2.224,6 mil barris por dia para 2.197,3 mil barris por dia). Esse resultado foi impulsionado pelas vendas de diesel, de energia elétrica – que contribuíram com 30% (cada item) na elevação de R$8,7 bilhões das receitas frente ao trimestre anterior – e do aumento das exportações de petróleo e derivados com maiores preços.
O outro lado disso é o aumento da importação de derivados no terceiro trimestre de 2017 realizado por outras empresas e redução do market share nesse segmento que representa cerca de 47% das receitas de vendas da Petrobras.
O bom desempenho das receitas de vendas foi revertido com o crescimento de 11% dos custos dos produtos e serviços vendidos, implicando numa queda de 1% no lucro bruto.
Em linhas gerais, não ocorreram grandes modificações no que diz respeito aos resultados operacionais entre o segundo e o terceiro trimestres, no entanto, a Petrobras não obteve os lucros esperados, o que pode ser explicado pelas perdas de participação no mercado de derivados e pelo fato de que a empresa não obteve grandes receitas extraordinárias com vendas de ativos como verificado no segundo trimestre de 2017.
Esses resultados do terceiro trimestre reforçam a tendência em curso da empresa de: 1) aumento das receitas oriundas da exportação de petróleo cru – que saltou de 7% no primeiro trimestre de 2016 para 14% no segundo trimestre de 2017 –; 2) redução deliberada da participação da Petrobras no mercado nacional de derivados fruto da atual política de preços e da estratégia de vendas de ativos (BR distribuidora) nesse segmento e 3) redução da dívida líquida da empresa.
Essa estratégia amplia a exposição da empresa a variáveis que ela não controla (câmbio e preço do petróleo), aumentando o risco futuro ao concentrar suas atividades na área de produção e exploração, dado a forte integração vertical que caracteriza o mercado de petróleo (do poço ao poste) em virtude dos seus custos e riscos.
Será que os dados da realidade estão deixando as claras os limites do discurso de que atual gestão da Petrobras estaria levando-a para o caminho correto com a recuperação da lucratividade?
Na verdade, o retorno da lucratividade na Petrobras nos trimestres recentes está associado à redução do impairment que são despesas não recorrentes e os melhores resultados operacionais são fruto da redução de custos de extração (abaixo de U$ 7 bilhão de barris (bbl)) que são o resultado da expansão dos investimentos do pré-sal realizados em gestões anteriores.
* Professor do Instituto de Economia da UFRJ e integrante do GEEP/FUP.
**Economista, técnico do DIEESE na subseção da FUP (Federação Única dos Petroleiros) e integrante do GEEP/FUP.
[1] Para uma explicação detalhada dessa hipótese, ver: https://jornalggn.com.br/noticia/mitos-e-verdades-sobre-o-endividamento-da-petrobras-por-eduardo-costa-pinto
[2] Os mercados erraram bastante em suas previsões. Os lucros registrados foram bem menores e a receita de vendas cresceu 7%. Em nota, o GEEP/FUP estimou crescimento das receitas de vendas de 1,2%.