Os números da economia vão mal. A festejada oportunidade que colunistas e certos economistas viram na chegada de Temer ao poder para a retomada do crescimento e da confiança dos mercados fez água.
Na área política – especialmente na tradicionalmente chamada “questão moral” – as coisas vão se desmaterializando.
O ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, pediu demissão na manhã desta quarta. Leia a carta:
“Salvador, 25 de novembro de 2016
Meu fraterno amigo Presidente Michel Temer,
Avolumaram-se as críticas sobre mim. Em Salvador, vejo o sofrimento dos meus familiares. Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair.
Diante da dimensão das interpretações dadas, peço desculpas aos que estão sendo por elas alcançados, mas o Brasil é maior do que tudo isso.
Fiz minha mais profunda reflexão e fruto dela apresento aqui este meu pedido de exoneração do honroso cargo que com dedicação venho exercendo.
Retornado à Bahia, sigo como ardoroso torcedor do nosso governo, capitaneado por um Presidente sério, ético e afável no trato com todos, rogando que, sob seus contínuos esforços, tenhamos a cada dia um país melhor.
Aos Congressistas, o meu sincero agradecimento pelo apoio e colaboração que deram na aprovação de importantes medidas para o Brasil.
Um forte abraço, meu querido amigo.
Geddel Vieira Lima”.
Será suficiente?
A reação dos meios de comunicação tradicionais ao escândalo é muito menor se comparada à histeria outrora provocada por qualquer movimento do governo Dilma. Como exemplo, basta lembrar que a presidenta eleita, por estar supostamente nervosa em determinada semana, ganhou as manchetes retratada como uma pessoa desequilibrada, e portanto inapta para o exercício de suas funções. Uma bronca que ela teria dado em auxiliares seria motivo para pedir sua cabeça.
Temer, não bastasse ter nomeado um ministério em que alguns integrantes são réus em investigações bastante adiantadas, por esses dias foi acusado de fazer lobby (expressão que a mídia adorava aplicar aos trabalhos diplomáticos de Lula) para que a lei fosse desrespeitada em benefício de Geddel, que queria garantir a posse de apartamento que seria construído ilegalmente numa área patrimônio histórico de Salvador.
Curioso: o caso de um apartamento no Guarujá rende até hoje uma perseguição que dura anos.
O ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, indicado após o golpe que derrubou Dilma, esta semana decidiu trazer a público acusação séria contra Geddel e contra o próprio Temer. Detalhe: Calero teria gravado a conversa que teve com Temer. A Polícia Federal, diante dos fatos, pediu à Procuradoria Geral da União que abrisse inquérito.
Calero faz parte do grupo político do ex-governador do Rio Sérgio Cabral, preso semana passada acusado de corrupção. Aqui e ali, o noticiário faz menção a um possível elo entre os dois acontecimentos.
No calor das primeiras revelações contra Temer – Geddel já estava na mira há dias – a oposição deu declarações dizendo que ia pedir o impeachment de Temer. Um dos porta-vozes da iniciativa é o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
“Evidentemente, estamos diante de um escândalo, entre tantos outros que envolvem o governo golpista, que o desmoraliza ainda mais e que aponta para a real possibilidade de queda do presidente ilegítimo”, avalia o secretário nacional de Comunicação da CUT, Roni Barbosa. “Porém, é algo que precisa amadurecer, ser bem debatido”, completa.
Vale lembrar que o ex-presidente FHC também foi apanhado em gravação na qual autorizava o uso de seu nome para uma transação que beneficiaria determinadas empresas estrangeiras no processo de privatização da Telebrás. O escândalo deu em nada.
Os desdobramentos da crise vão necessariamente levar a novas perguntas: em caso de queda de Temer, como se escolherá o próximo ocupante do Palácio do Planalto? Voltaremos ao tema.
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