Por Davi Macedo, do Sindipetro PR/SC
Ingenuidade, falta de informação especializada ou má-fé? Apostaríamos todas nossas fichas na última opção. O editorial do jornal Gazeta do Povo desta quinta-feira, dia 15 de outubro de 2015, cometeu uma série de erros crassos ao tentar criticar o marco regulatório do setor petróleo no Brasil.
Já no título “Prejuízos da ideologia estatizante – Fiasco do leilão da ANP semana passada comprova a falência do modelo ideológico imposto pelo governo à exploração de petróleo”, constata-se a primeira cinca. O referido leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP) não foi feito nos moldes da lei da partilha, como sugere o jornal, mas sim no modelo de concessão, porque os blocos ofertados – 266, em 22 setores de 10 bacias sedimentares – não estão na área do pré-sal. A lei 12.351/2010 estabelece que o regime de partilha de produção deve ser aplicado para a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluídos na área do pré-sal.
Ao discorrer sobre o regime de partilha, mais uma pataquada da Gazeta. O periódico afirma que o modelo “tem se mostrado um fracasso”. O curioso é que não explica com fatos tangíveis o tal insucesso, apenas remete à determinação da lei de que a Petrobrás seja operadora exclusiva nos campos do pré-sal, com a participação mínima de 30% na produção dos poços. Para deixar a situação ainda mais vexatória ao jornal do Grupo RPC, rede afiliada da TV Globo, o modelo de partilha sequer foi testado. A 12ª Rodada de Licitações da ANP foi o primeiro leilão que ofertou áreas de exploração do pré-sal – no caso o Campo de Libra – foi realizado em 2013. Porém, a produção naquela área está prevista para começar apenas em 2019.
O editorial segue sua sina de constrangimento ao debochar da “ideologia estatizante”. Apresenta um profundo desconhecimento (ou má-fé) da geopolítica do petróleo. 13 são as estatais entre as maiores empresas de petróleo e gás do mundo – as chamadas national oil companies (NOCs). Entre elas, estão a Saudi Aramco (Arábia Saudita), a NIOC (Irã), a KPC (Kuwait), a ADNOC (Abu Dhabi), a Gazprom (Rússia), a CNPC (China), a PDVSA (Venezuela), a Statoil (Noruega), a Petronas (Malásia), a NNPC (Nigéria), a Sonangol (Angola), a Pemex (México) e a Petrobras. Em uma estimativa conservadora, feita em 2008, antes do pré-sal ser bem conhecido, as NOCs já dominavam 73% das reservas provadas de petróleo do mundo e respondiam por 61% da produção de óleo.
Até 1970, as chamadas international oil companies (IOCs), as grandes multinacionais, as Sete Irmãs, dominavam inteiramente 85% das reservas mundiais de petróleo. Outros 14% das jazidas eram dominados por empresas privadas menores e as NOCs tinham acesso a apenas 1% das reservas. As estatais que existiam na época, como a YPF (Argentina) a Pemex (México), a Petrobras e a PDVSA, não tinham a menor influência real nesse mercado.
A partir do final da década de 60 e início dos anos 70 houve uma onda de nacionalização do petróleo por parte dos países detentores de grandes reservas. Os governos passaram a se apropriar de uma renda muito maior da cadeia do óleo, até mesmo porque descobriram que as IOCs escondiam deles os reais custos de produção, reduzindo artificialmente a remuneração devida aos países. Na lógica da Gazeta, o modelo a ser seguido deveria ser dos Estados Unidos, onde “a exploração de petróleo é feita por empresas privadas normalmente e sem ameaça à segurança nacional”. Só esqueceram um pequeno detalhe: o histórico dos Estados Unidos no setor é de ser um grande importador e preservar suas reservas para serem utilizadas no futuro. Afinal de contas, o petróleo é uma fonte de energia estratégica.
Ainda na linha dos erros, o editorial sustenta que a Petrobras desfruta de “um monopólio que a livra de ter de ser eficiente e competir”. Cabe lembrar que o monopólio estatal do petróleo foi quebrado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, através da Lei Nº 9.478/1997. A partir de então, o capital privado e internacional tiveram a oportunidade de investir e atuar no setor petróleo brasileiro, mas não foi exatamente o que aconteceu. O mercado brasileiro era considerado de risco e apenas a Petrobrás seguiu investindo. O resultado é que a empresa detém 95% de participação no setor do país. Com o anúncio da descoberta do pré-sal, em 2008, os olhos das grandes petrolíferas começaram a se voltar para o Brasil.
A Gazeta do Povo também ataca o fortalecimento do mercado interno ao criticar as cláusulas contratuais que obrigam as empresas que atuam na área do pré-sal a adquirirem parte dos equipamentos de empresas brasileiras, o chamado conteúdo nacional. Ainda que o custo inicial seja um pouco mais elevado que o praticado no mercado internacional, o ganho social é relevante, com o desenvolvimento da indústria nacional e a geração de emprego e renda no Brasil.
É lamentável que um jornal de grande circulação exponha sua linha editorial com críticas infundadas e até mesmo inverídicas, o que leva desinformação aos seus leitores, patrimônio humano pelo qual a Gazeta deveria zelar.
Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina