Por Vanilda Oliveira, da CUT Nacional
Pense em um profissional que passa parte da vida na corda bamba por ter de se desdobrar entre mais de um local de trabalho para driblar um salário indecente. No Brasil, muitos trabalhadores preenchem esse perfil, mas não têm como tarefa nem responsabilidade principal encher de (bons) conhecimentos, e sonhos, as mentes de milhões de crianças e adolescentes em formação.
Com um dos piores pisos salariais do País – R$ 1.567 por jornada de 40 horas semanais -, a maioria dos professores da rede pública de ensino comemora hoje o seu dia de olho no que acontece em Brasília. É lá, dentro e fora dos gabinetes do poder, que representantes dessa categoria tão importante, mas tão desrespeitada tentam debater, conquistar e ampliar os seus direitos. Nas ruas, como na greve do Rio, eles tem sofrido com a violência policial.
No gramado da Esplanada dos Ministérios, em frente ao Senado, a militância da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE-CUT) permanece acampada desde 30 de agosto e lá promete ficar até que o Plano Nacional de Educação (PNE) seja aprovado.
Dentro do Congresso, entidades que representam os professores participam na manhã desta terça-feira (15) de mais uma audiência pública com o Conselho de Educação para debater o projeto de lei que aprova o PNE.
O Plano define as principais metas que o Brasil deve atingir na educação durante os próximos dez anos e entre seus itens mais importantes está o que exige a destinação e aplicação de pelo menos 10% do Produto Interno Bruto (PIB) na educação. Fazem parte das suas diretrizes a erradicação do analfabetismo e a universalização (garantia de acesso) do atendimento escolar.
O texto do PNE também propõe a utilização de 50% dos recursos do pré-sal, incluídos os royalties, diretamente em educação. Hoje, esse percentual não chega a 20%. A CNTE reivindica e se mobiliza para que o total dos royalties do pré-sal seja destinado apenas à educação.
Apresentado pelo governo federal, o projeto possui 14 artigos e 20 metas e já tramita há três anos no Congresso. A mais recente votação e aprovação em comissões "descaracterizou o texto do projeto", segundo a Confederação.
RANKING RUIM – A aprovação do PNE será decisiva para modificar a difícil realidade dos professores brasileiros. E as pesquisas servem de termômetro do modo como os docentes são tratados no Brasil, onde o professor recebe um dos piores salários da categoria entre 40 países pesquisados, segundo estudo realizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Divulgado em julho deste ano, o vergonhoso ranking, mostra que o Brasil só perde para o salário de docentes do Peru e da Indonésia.
Outra pesquisa também da Unesco, esta realizada em 2010, mostra que o salário médio de um professor brasileiro do Ensino Fundamental em início de carreira é o terceiro mais baixo do mundo entre 38 países avaliados. Um terceiro levantamento revela que o professor é a categoria que recebe o mais baixo salário de todos os profissionais com nível superior do País
Tantos dados negativos explicam, em parte, porque faltam mais de 700 mil professores na rede pública de ensino brasileira. A ausência ou precariedade de estrutura, a pesada burocracia dos quilos de pastas, formulários e diários de classe que o professor ainda tem de carregar em plena era digital, o trabalho extra classe, o alto índice de adoecimento e a violência sofrida por muitos deles dentro da própria sala de aula também explicam o fato de a profissão não ser mais tão atrativa como foi no passado.
Os jovens parecem não estar interessados em entrar em uma profissão com tantos desafios, além do maior deles, que é ensinar, contribuir com a formação dos cidadãos. Pelo menos é o que aponta a pesquisa Atratividade da Carreira Docente no Brasil feita pela Fundação Victor Civita. Segundo o levantamento, somente 2% de alunos do ensino médio têm interesse em seguir carreira de professor.
Encomendado pela Unesco, o estudo Professores do Brasil: Impasses e desafios revela que, em geral, o jovem que procura a carreira de professor hoje no Paístem origem nas classes mais baixas e fez sua formação na escolas públicas.
VIOLÊNCIA – Além do salário e problemas extra classe, as pesquisas também revelam que a categoria sofre com a violência dentro dos muros das escolas onde lecionam. Levantamento do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp), divulgado em maio deste ano, mostra que 44% dos professores da rede estadual já sofreram algum tipo de violência no ambiente de trabalho.
Segundo a apuração da Apeoesp, a agressão verbal é a forma mais comum de ataque e já atingiu 39% dos docentes. Em seguida, vêm assédio moral (10%), bullying (6%) e agressão física (5%). O estudo mostra ainda que docentes do sexo masculino que trabalham no ensino médio são os mais atingidos pela violência – 65% deles foram agredidos de alguma forma.
PERFIL – O Brasil tem 2 milhões de professores na educação básica, que vai da ensino infantil ao médio. Nos bancos escolares, 40,3 milhões de estudantes estão matriculados nas redes públicas estaduais e municipais de ensino em todo o País.
De acordo com o Censo Escolar 2012, realizado pelo Ministério da Educação (o censo de 2013 ainda está em andamento), 81% dos professores brasileiros são do sexo feminino; 58% têm até 40 anos de idade e 23% declaram trabalhar em mais de uma escola para conseguir complementar a renda.
Dos 2 milhões de professores da rede pública brasileira, 400 mil deixam a frente do quadro negro para ocupar uma cadeira como aluno do ensino superior, indicador de uma boa notícia que vem sendo consolidada nos últimos anos – o aumento do número de professores com formação universitária.
Daí a importância da aprovação do PNE, conforme as reivindicações da categoria, não apenas para os professores e professoras, mas para toda a sociedade, porque melhorar a qualidade da educação básica depende diretamente da formação dos docentes. O Plano Nacional de Educação, em seu diagnóstico, define que “a qualidade do ensino só poderá acontecer se houver a valorização dos profissionais do Magistério, que apenas será alcançada por meio de uma política global capaz de articular a formação inicial, as condições de trabalho, o salário, a carreira e a formação continuada”.