CUT
“A desigualdade não é inevitável… Não é resultado das leis da natureza nem das leis econômicas. É algo que criamos por nossas políticas, pelo que fazemos. Criamos esta desigualdade, optamos por ela, com leis que debilitaram sindicatos, que corroeram nosso salário mínimo aos seus níveis mais baixos em termos reais desde a década de 50, com leis que permitiram aos altos executivos captar um pedaço maior do pastel empresarial, leis sobre falências que colocam as inovações tóxicas de Wall Street acima dos trabalhadores”.
Joseph Stiglitz, Nós criamos essa desigualdade, setembro de 2013
Dirigido inicialmente à Convenção da AFL-CIO, o alerta do prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz sobre a magnitude da desigualdade e da hiperconcentração de renda iniciada com a quebra do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008, caiu como uma luva para o debate realizado pela Comissão Sindical Consultiva (TUAC) daOrganização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Como apontaram vários observadores no encontro da TUAC, realizado dia 11 de dezembro em Paris, as desigualdades econômicas se traduzem cada vez mais em desigualdades políticas, “com as enormes disparidades entre os ricos e o resto da população contribuindo para a acumulação significativa de poder político por parte da camada mais acomodada”. Uma situação gravíssima, particularmente quando o desemprego nos países industrializados segue sendo cerca de 50% superior ao de antes da crise. Enquanto os bancos e especuladores turbinam seus lucros com programas de “ajuste” estruturais que reduzem os Estados a guardiães dos interesses do sistema financeiro, com a privatização dos serviços e corte de direitos, nos países em desenvolvimento, há 100 milhões de pessoas a mais em situação de extrema pobreza. E as políticas neoliberais continuam cavando o fosso sem fundo.
O debate na TUAC foi sobre como incrementar a igualdade com um programa de políticas para promover o crescimento inclusivo. Nossa contribuição se centrou na importância estratégica do papel do Estado na luta contra as desigualdades e de como o sindicalismo, a partir do diálogo social e da negociação coletiva pode e deve ser um forte aliado no enfrentamento à crise. Reiteramos que apenas o crescimento econômico não garante por si só a diminuição da pobreza e que o combate à exclusão social passa longe da lógica do lucro a qualquer preço, que dirige um “mercado” cada vez mais tomado por monopólios e oligopólios.
Como os governos progressistas do Brasil e de vários países latino-americanos têm demonstrado no combate à crise internacional via fortalecimento do mercado interno, somente o Estado, através de políticas afirmativas, pode incluir socialmente a população mais pobre e garantir justiça social. Mas, para isso, como já alertou o economista Joseph Stiglitz, é necessário fazer opções, que passam pelo respeito à organização sindical, com diálogo social e negociação coletiva com as entidades representativas dos trabalhadores, tudo o que nos querem negar os que provocaram a crise e que hoje ampliam seus lucros com ela.
Diferente do receituário neoliberal, em nosso país, investimentos do Estado em programas como o Bolsa Família; de estímulo à agricultura familiar; de fomento ao estudo e à capacitação da juventude universitária, como o ProUni; de respeito às trabalhadoras domésticas – com a ratificação da Convenção 89 da OIT; foram decisivos para ampliar a cidadania a milhões de pessoas, garantindo melhorias efetivas na qualidade de vida, com ênfase nas mulheres e nos jovens. Obviamente, é preciso avançar muito ainda em áreas como a reforma agrária, que segue travada pela pressão do agronegócio; ampliar os investimentos na saúde, educação, ciência e tecnologia; democratizar os meios de comunicação e preservar o patrimônio público nacional, defendendo nossa soberania frente aos ataques dos cartéis estrangeiros.
Conforme apontam vários estudos, a política de valorização do salário mínimo acordada pela CUT e as demais centrais sindicais com o governo Lula – reflexo do fortalecimento da democracia e do diálogo social – possibilitou ganhos reais que impactaram a evolução da massa salarial e do salário médio do conjunto das categoriais. Reflexo deste avanço, hoje o desemprego em nosso país é de 5,2%, enquanto era de 13% na década passada. Atualmente 95% dos acordos salariais são acima da inflação, enquanto em 2001 eram apenas 20%.
Essa é uma realidade totalmente distinta das economias dos EUA e da Europa, que seguem na contramão, buscando ampliar a superexploração da força de trabalho e fazer com que a sociedade pague por serviços públicos cada vez mais precários, privatizados ou terceirizados. A fórmula neoliberal para sair da crise tem consistido em mais do mesmo, buscando manter intocados os privilégios – e superlucros – da casta dominante. Assim, no extremo superior da escala de rendimentos da OCDE, o 1% mais alto fica com a maior parte do incremento dos rendimentos, o que não apenas agrava o problema social, como produz sérios prejuízos econômicos, tornando-se um obstáculo à recuperação.
Dados da OCDE mostram que a proporção da retribuição do trabalho na renda nacional diminuiu em 26 das 30 economias desenvolvidas de 1990 a 2009 e que o percentual médio da participação do trabalho na renda nacional nestes países se reduziu de 66,1% a 61,7%, com a economia dos Estados Unidos patinando.
Estudos divulgados no evento apontam que nas últimas três décadas o 0,1% do extremo superior da pirâmide, a nata das transnacionais e do sistema financeiro, multiplicou quase por quatro os seus ingressos nos EUA e na Inglaterra e por mais de três na Austrália. A elevada desigualdade também fulmina Israel e começa a chegar com força na Alemanha, Dinamarca e Suécia, alertam os economistas.
Infelizmente, este é o quadro econômico de um retrocesso político e sindical de grandes proporções. Afinal, nos EUA mais de 90% dos trabalhadores não têm direito à negociação coletiva. Na Europa, os diferentes governos neoliberais têm reduzido o acesso aos direitos sociais e trabalhistas, enquanto as empresas ampliam suas margens de lucro.
Frente a tais agressões e diante da sua responsabilidade, a Confederação Sindical Internacional dos Trabalhadores (CSI) e suas entidades filiadas devem ampliar a unidade e a mobilização da classe trabalhadora em todo o mundo para fazer a roda da economia e dos direitos, girar. Diálogo social, negociação coletiva e liberdade sindical são, mais do que nunca, um imperativo do desenvolvimento sustentável, com distribuição de renda e valorização do trabalho.
Se o mundo precisa crescer. Esta é a nossa receita.