No dia 2 de maio de 2017, completou-se 20 anos da morte de Paulo Freire, que nos deixou o legado de uma pedagogia crítica e libertadora dos oprimidos, que compreende a educação no sentido amplo, como processo de formação, cujo objetivo fundamental é de humanizar e emancipar.
Suas formulações, sua prática educativa, demonstrou que a educação não pode se limitar a transmitir conteúdos, mas, sobretudo, a produzir conhecimentos como elemento constituinte da prática da liberdade. Ele afirma que “não basta saber ler que ‘Eva viu a uva’. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho”. Ou seja, a educação ao pretender emancipar, deve tomar como ponto de partida a realidade, a situação de exploração dos oprimidos e análise crítica desta, para a busca da superação dessa situação de opressão, através da luta, organização e a construção de uma sociedade justa e igualitária.
Freire acreditava profundamente no ser humano e nos ensinou que somos seres inconclusos, compreendendo a educação e a aprendizagem como processos que perduram a vida toda. Dessa forma, acreditava que a mudança é possível, e compreendia a educação como uma instrumento para essa mudança, recusando o pensamento fatalista (neoliberal) que nega o sonho de outro mundo possível. Nas palavras de Freire, “a educação não muda o mundo, a educação muda as pessoas, as pessoas mudam o mundo”.
Ele nos inspira a nutrir o nosso difícil e sempre atual processo de luta pela superação das opressões. No dia 17 de abril de 1997, em sua última entrevista, se referiu à marcha do MST, como um das expressões da importância da organização de marchas, dos que não tem escola, dos reprovados, dos que querem amar e não podem. “Eu estou absolutamente feliz por estar vivo ainda e ter acompanhado essa marcha (Marcha dos Sem Terra) que como outras marchas históricas revelam o ímpeto da vontade amorosa de mudar o mundo”.
O mestre Freire está vivo nas diversas educadoras e educadores que ensinam a ler criticamente o mundo e nas educandas e educandos que aprendem que a liberdade está além do ABC. Seu legado está presente na luta por uma Educação Pública e Popular.
Histórico
Paulo Reglus Neves Freire nasceu no dia 19 de setembro de 1921, no Recife, Pernambuco, uma das regiões mais pobres do país, onde logo cedo pôde experimentar as dificuldades de sobrevivência das classes populares. Trabalhou inicialmente no SESI (Serviço Social da Indústria) e no Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife. Em 1946, é indicado ao cargo de diretor do Departamento de Educação e Cultura do Serviço Social no Estado de Pernambuco e começa a lecionar para analfabetos pobres.
Freire foi professor de escola e também a criador de ideias e “métodos”. Sua filosofia educacional expressou-se primeiramente em 1958 na sua tese de concurso para a universidade do Recife, e, mais tarde, como professor de História e Filosofia da Educação daquela Universidade, bem como em suas primeiras experiências de alfabetização como a de Angicos, em 1963, quando ensinou 300 adultos a ler e escrever em 45 dias. Esse método foi adotado em Pernambuco e tinha como pressuposto um trabalho de educação que identifica a alfabetização com um processo de conscientização, capacitando o oprimido tanto para a aquisição dos instrumentos de leitura e escrita quanto para sua libertação. O trabalho de Freire com os pobres e internacionalmente aclamado, teve início no final da década de 40 e continuou de forma ininterrupta até 1964.
A metodologia por ele desenvolvida foi muito utilizada no Brasil em campanhas de alfabetização e, por isso, ele foi acusado de subverter a ordem instituída, sendo preso após o Golpe Militar de 1964. Depois de 72 dias de reclusão, foi convencido a deixar o país. Exilou-se primeiro no Chile, onde, encontrando um clima social e político favorável ao desenvolvimento de suas teses, desenvolveu durante cinco anos trabalhos em programas de educação de adultos no Instituto Chileno para a Reforma Agrária (ICIRA). Em 1967, Paulo Freire publica seu primeiro livro “Educação como prática da liberdade”. Sua principal obra, a “Pedagogia do oprimido”, foi escrita em 1968 e foi traduzido para diversos idiomas, tal como o espanhol, o inglês e o hebraico. Por ocasião da rixa política entre a ditadura militar e o socialista-cristão, o livro não foi publicado no Brasil até 1974, quando o general Geisel tomou o controle do país e iniciou um processo de liberalização cultural.
Em 1969, trabalhou como professor na Universidade de Harvard no Centro para Estudos de Desenvolvimento e Mudança Social, em estreita colaboração com numerosos grupos engajados em novas experiências educacionais, tanto em zonas rurais quanto urbanas. Em 1970, depois de um ano em Cambridge, Freire mudou-se para Genebra, na Suíça, para trabalhar como consultor educacional do Conselho Mundial de Igrejas por um período de 10 anos. Durante este tempo, atuou como consultor em reforma educacional em colônias portuguesas na África, particularmente em Guiné Bissau e Moçambique. Com essas consultorias, desenvolveu programas de alfabetização para a Tanzânia e Guiné Bissau, que se concentravam na reafricanização de seus países e para algumas ex-colônias portuguesas pós-revolucionárias como Angola, Moçambique e as ilhas de São Tomé e Príncipe, que lutavam pela reconstrução do país e de uma identidade nacional republicana.
Em 1971, Freire fez sua primeira visita a Zâmbia e Tanzânia. Em seguida, passou a ter uma participação mais significativa na educação de Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. E também influenciou as experiências de Angola e Moçambique.
Em 1980, depois de 16 anos de exílio, retornou ao Brasil para “reaprender” seu país. Lecionou na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). E atuou como supervisor para o programa do partido para alfabetização de adultos de 1980 até 1986.
Em 1989, tornou-se Secretário de Educação no Município de São Paulo durante a gestão de Luíza Erundina. Durante seu mandato, fez um grande esforço na implementação de movimentos de alfabetização, de revisão curricular, e empenhou-se na recuperação salarial dos professores.
No ano de 1991 é fundado o Instituto Paulo Freire, em São Paulo, para estender e elaborar suas teorias sobre educação popular.
Em Paulo Freire, conviveu sempre presente um senso de humor e a não menos constante indignação contra todo tipo de injustiça. Casou-se, em 1944, com a professora primária Elza Maia Costa Oliveira, com quem teve cinco filhos. Após a morte de sua primeira esposa, casou-se com Ana Maria Araújo Freire, uma ex-aluna.
Paulo Freire é autor de muitas obras. Entre elas: Educação: prática da liberdade (1967), Pedagogia do oprimido (1968), Cartas à Guiné-Bissau (1975), Pedagogia da esperança (1992) À sombra desta mangueira (1995).
Foi reconhecido mundialmente pela sua práxis educativa através de numerosas homenagens. Além de ter seu nome adotado por muitas instituições, é cidadão honorário de várias cidades no Brasil e no exterior. A Paulo Freire foi outorgado o título de doutor Honoris Causa por vinte e sete universidades.
Por seus trabalhos na área educacional, recebeu, entre outros, os seguintes prêmios: “Prêmio Rei Balduíno para o Desenvolvimento” (Bélgica, 1980); “Prêmio UNESCO da Educação para a Paz” (1986) e “Prêmio Andres Bello” da Organização dos Estados Americanos, como Educador do Continente (1992). No dia 10 de abril de 1997, lançou seu último livro, intitulado “Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa”. Paulo Freire faleceu no dia 2 de maio de 1997 em São Paulo.
Assista o documentário “Pensando com o Paulo Freire”.
Baixe aqui a Cartilha Paulo Freire – Um educador do povo, 2005.pdf
Paulo Freire Vive!
(Ecrito por Alessandro Mariano, da Página do MST e editado por Leonardo Fernandes da Rede Brasil Atual)