Presidente da Petrobrás afirma que definição de marcos regulatórios podem significar uma mudança profunda na indústria nacional

Pela primeira vez desde que foi batido o martelo para o megainvestimento da Petrobrás…

Estadão

Pela primeira vez desde que foi batido o martelo para o megainvestimento da Petrobrás de US$ 174 bilhões até 2013, o presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, admitiu ter defendido um plano de investimentos para este ano mais modesto que os R$ 61 bilhões aprovados pelo conselho de Administração, presidido pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Em razão da crise financeira internacional, Gabrielli acreditava que a manutenção do mesmo nível do ano passado, de R$ 54 bilhões, já seria uma boa estratégia. Passado o primeiro quadrimestre do ano, ele já acredita que foi correta a ousadia do governo de manter a agressividade na programação para 2009. Diz que a estatal está conseguindo bons preços, já não precisa de nenhuma captação financeira, a não ser para garantir investimentos a partir de 2010, e afirma: "Somos o grande comprador mundial". O executivo também deixa claro que ainda há divergências quanto à legislação para o pré-sal e adianta que será necessária a discussão no Congresso. A seguir, trechos da entrevista concedida ontem pelo executivo ao Estado, na sede da estatal.

A Petrobrás ainda depende de grandes captações para garantir investimento?

A Petrobrás fechou o ano com R$ 16 bilhões em caixa. Em fevereiro, captamos em bonds (títulos de dívida no mercado internacional) US$ 1,5 bilhão, como parte de um empréstimo-ponte de US$ 6,5 bilhões de um conjunto de bancos. Isso, em pleno auge do furacão. Esses recursos foram colocados à disposição por um prazo de dois anos. Pegamos US$ 2 bilhões do Eximbank (banco de fomento norte-americano). Não precisamos mais de dinheiro para este ano.

Para investimento de quanto? Nosso investimento é de R$ 61 bilhões. São R$ 5 bilhões por mês, sabe lá o que é isso? É muito dinheiro. Isso está financiado, já, não tem problema.Em 2010, se o preço do barril do petróleo for de US$ 40, vamos ter, livres, US$ 16 bilhões. Temos oferta do BNDES de mais R$ 20 bilhões para 2010. Estamos negociando com os chineses um empréstimo grande, grande, grande. Já assinamos um memorando de entendimentos, mas não falamos o valor (em fevereiro, um memorando anunciou o valor de US$ 10 bilhões). Sai dentro em breve.

É verdade que o sr. preferia um plano de investimentos mais modesto para a empresa?

Acho que nessa fase, para viabilizar margem de redução custos, se poderia, talvez, ter uma negociação mais dura. Isso significaria um investimento um pouquinho menor em 2009, em torno de US$ 54 bilhões, como foi no ano passado. Em nenhum momento defendi reduzir investimentos. Mas acho que a situação acelerou tanto que estamos claramente observando redução de custos em contratos, maior presença de competidores em nossas licitações e redução do prazo de entrega de equipamentos críticos. Então, acho que foi correta a decisão do conselho. Do ponto de vista financeiro, não há problema.

Porque não cresce mais, já que não tem problema financeiro?

Acho que não tem problema financeiro grave. O limitador hoje é a disponibilidade de equipamentos e a capacidade da cadeia de fornecedores. É entrega de sonda, plataforma… Mas a única demanda para águas profundas hoje no mundo é nossa.

A Petrobrás foi beneficiada pela crise?

Claro, somos o grande comprador mundial.

A indefinição das normas para o pré-sal está emperrando?

Veja bem: quanto tempo levou para ser criada a lei que criou a Petrobrás, a lei 2004? Uns três ou quatro anos. Quanto tempo levou para a criação da Lei 9748, de 1998? Mais uns três ou quatro anos. Por que, então, vocês estão querendo que isso agora seja feito em um ano? Afinal, Tupi foi descoberto em 2006, mas só em 2008 é que se começou a discutir o marco regulatório.

O presidente Lula está apressado, cobrando a definição?

O presidente precisa… O País precisa ter um marco regulatório para áreas do pré-sal ainda não licitadas. A definição dos marcos – e não será apenas um – vai organizar o setor de petróleo para o futuro. Esses marcos podem significar uma mudança profunda na indústria nacional. Ela pode caminhar para um modelo absolutamente excludente, de depender somente do petróleo e do gás, ou pode levar a um modelo de transformação da sociedade, com ampliação das atividades da cadeia produtiva, melhoria de distribuição de renda, a utilização dos excedentes para facilitar uma transferência de recursos. É tão importante que tem de ser maduro, pensado, discutido. E não só pelo Executivo. Vai ter de ir para o Congresso, o Judiciário.

Então, vai ter de mexer na Lei do Petróleo.

Vai ter que mexer, claro. A lei atual não serve. Foi montada, em 1998, em duas circunstâncias principais: pouco capital, com o petróleo a US$ 11 o barril, e o Brasil estava sem recursos e precisava atrair capital. Para isso teria uma lei para remunerar quem iria investir, apesar do risco exploratório. É uma lei que garante que quem acerta o bilhete premiado vai ganhar. Hoje, o Brasil tem uma situação completamente distinta.