Paulo Henrique Amorim vai à guerra contra o PiG


Em 2005, ele lançou um livro-reportagem com disparos em direção à Rede Globo. Foi o contundente Plim-Plim — A Peleja de Brizola contra a Fraude Eleitoral (Conrad Editora). Agora, o jornalista Paulo Henrique Amorim prepara outra bomba — o “livro sobre o PiG” (Partido da Imprensa Golpista). Além de Globo, sobrarão projéteis contra mais veículos da grande mídia, como Veja, IstoÉ, Folha e O Estado de S.Paulo.

Na entrevista ao Vermelho, concedida em abril, na sede da TV Record, em São Paulo (SP), PHA comentou diversos episódios que, certamente, estarão em seu próximo livro. Caso do rompimento de contrato imposto a ele pelo iG em março passado. A rescisão — ou “limpeza ideológica, como Amorim prefere enunciar — subtraiu-lhe a visibilidade, a estrutura e o salário propiciados por um grande portal.

Mas PHA não se intimidou. Além de o Conversa Afiada ter voltado ao ar em menos de nove horas, o jornalista recuperou — através de um mandado de segurança — o conteúdo apagado pelo iG e até elevou o tom das denúncias. Convém aguardar o “livro do PiG”, cujo lançamento está previsto para este ano. A entrevista a seguir, para todos os efeitos, é um aperitivo do que vem por aí.

Você disse à Revista Fórum que soube de sua demissão enquanto participava de uma gravação na Record. Como foi que tudo ocorreu?

Eu estava gravando um programa de três blocos chamado Entrevista Record, da Record News. No intervalo do segundo para o terceiro bloco — como trocava de entrevistado e eu tinha um pouco mais de tempo —, liguei para o meu editor lá no iG, o Givanildo Menezes, e disse: “O quê que há de novo aí?”. Então ele falou: “Tenho uma má notícia para te dar: nós saímos do ar”. E eu: “Como assim?”. “Não só saímos do ar como fomos expulsos do iG.” Então eu disse: “Segura aí que, quando acabar o programa, vou ver o que aconteceu”. 

Procurei me informar e rapidamente se configurou o quadro de que não só a minha equipe que trabalhava lá tinha sido ejetada do prédio do iG. Também houve um fenômeno muito interessante, que eu apelidei de “limpeza ideológica” — por oposição ou por analogia à chamada “limpeza étnica” que se produziu nos escombros da Iugoslávia. É o fato de você apagar a minha existência do ar. Eu não conseguiria — ninguém conseguiria! — acessar o meu trabalho profissional e intelectual no iG nos últimos dois anos.

Isso foi à noite, no fim da tarde — gravo aqui na Record mais ou menos a esta hora, 16h30, 17 horas. Vim para a redação do Domingo Espetacular, que é minha base de operações, e soube que o iG tinha tentado entregar a carta de demissão, a notificação do rompimento do meu contrato, e utilizou até a xerox da Record — o que configura, na minha opinião, uma tentativa de me incompatibilizar com o patrão, que é a Record e que não tem nada a ver com essa história. Eu faço questão de distinguir claramente: o trabalho no meu site pessoal é uma coisa inteiramente privativa, que não se confunde com meu trabalho na televisão.

Como o site voltou ao ar?

Saí daqui depois de cumprir as minhas tarefas. Conversei com alguns amigos e imediatamente recebi a proteção de dois deles. Fui para o escritório de um deles, o (jornalista) Rubens Glasberg, que disse: “Vem para cá, que nós vamos botar você no ar logo”. O Glasberg já tinha mobilizado um outro amigo nosso, o (empresário) Luiz Roberto Demarco, que luta há muitos anos contra o (banqueiro) Daniel Dantas, assim como o Glasberg, que é vitima de inúmeros processos do Dantas contra ele, na tentativa de calá-lo. 

O Glasberg e mais a equipe do Demarco trabalharam durante 8 horas e 58 minutos. No final, meu site estava no ar — é este que está no ar hoje. Que é uma forma, digamos, precária, provisória, porque ele tem mecanismos de atualização rudimentares, enquanto a gente processa uma reforma de tal maneira que eu possa vir a ter um site bastante competitivo e moderno. 

No começo, você chegou a especular que foi o (governador de São Paulo, José) Serra quem o demitiu...

Não é querer ser megalomaníaco, mas o José Serra, por exemplo, ligou para o presidente da Record duas vezes e pediu a minha cabeça. 

Em que época?

Isso foi quando eu fazia o programa Tudo a Ver. Eu tinha um quadro chamado "Assim não Dá", com o meu querido amigo Luciano Faccioli. Era um programa de denúncia de mazelas municipais — a bica d’água, a falta de vacina —, que tem em qualquer programa do mundo inteiro, não é? E o Serra pediu a minha cabeça para o Alexandre Raposo (presidente da Record), que achou que não valeria a pena me dispensar. Eu agradeço e fico muito feliz (risos). A Record acabou de renovar meu contrato, me concedeu um aumento — então eu estou muito feliz aqui, me sinto muito prestigiado, estou muito bem, obrigado (risos).

O Serra é um suspeito. Ele tem uma relação visceral, consangüínea, com o Caio Túlio Costa (presidente do iG), que eu passei a chamar de Caio T. (“T” de Tartufo) Costa. O Mino (Carta) e eu instituímos o grande troféu do Tartufo Nativo, mas encerramos a votação, e ele não venceu. Mas eu consultei o Mino ontem, e nós já o nomeamos “observador da ética” na apuração dos votos do Tartufo. Ele é um especialista em ética no jornalismo (risos). 

E o Serra é muito ligado a ele. O Caio foi o fundador do UOL, e o primeiro chat do UOL foi com o Serra, não se sabe bem por quê. O Serra, naquele chat, emitiu conceitos tão relevantes e tão profundos que foram escritos nas pedras da Acrópole de Atenas, para a humanidade preservar aquela contribuição dele à cultura ocidental (risos). E o Caio, desde então, mantém uma ligação íntima, intelectual e filosófica com o Serra. Esse é um núcleo dos problemas que eu tive lá no iG. 

Há cerca de dois anos, numa palestra sua, você disse que tinha 12 advogados. Quantos tem agora, para encarar esses problemas todos?

Eu perdi a conta (risos). Agora, no episódio da minha saída do iG, eu tive uma decisão fantástica. Poucas horas depois de eles me tirarem do ar e fazerem a “limpeza ideológica”, eu tive um mandado de segurança e entrei lá dentro. O juiz mandou deixar um pelotão da Polícia Militar. Se houvesse uma resistência — se as brigadas do Caio T. resistissem —, aquilo ali seria arrombado. Eu ia arrombar aquele predinho ali da rua Amauri, por decisão judicial, para reaver o produto do meu trabalho intelectual. 

Esse argumento oficial do iG — de que o Conversa Afiada não dava audiência — é falso, não é?

Falsíssimo! 

Ainda mais com aquele destaque diário na capa do iG…

Se não desse audiência, o iG não dava! 

Depois disso, você teve contato com algum deles — com o Caio Túlio Costa, por exemplo?

Espero não encontrá-los à noite (risos). 

Mas não foi só o Serra…

O outro núcleo é evidentemente o Daniel Dantas, com quem mantenho há algum tempo uma batalha inútil. O Daniel Dantas tem a peculiaridade, primeiro, de ganhar todas as causas aqui no Brasil. Quando as causas são redigidas em língua inglesa, ele perde. Foi o que aconteceu, por exemplo, na Justiça britânica, onde ele perdeu em várias instância 

Nos Estados Unidos, ele come o pão que o diabo amassou porque lá também as causas versam na língua inglesa. Não sei, deve ser uma questão etimológica — uma questão que tem a ver com as línguas de origem indo-européia (risos). Preciso fazer um estudo sobre isso com algum professor de Filologia: por que ele ganha em português e perde em inglês?

Além disso, eu travei uma batalha importante com relação à “BrOi” (empresa resultante da compra da Brasil Telecom pela Oi). A “BrOi” não é apenas a fusão de uma empresa de telecomunicações com outra empresa de telefonia. Para que ela possa existir, para que se materialize, a “BrOi” exige como pré-condição fundamental esquecer os crimes do Daniel Dantas — apagar das pedras os crimes que ele cometeu —, denunciados pela Brasil Telecom na Justiça brasileira e na Justiça de Nova York. 

Denunciados de maneira inepta, na minha modesta opinião — mas, de qualquer maneira, denunciados. E tanto pelo Citibank quanto pela Brasil Telecom. Quando os fundos de pensão entregaram a administração da Brasil Telecom ao Daniel Dantas, o Dantas saqueou a empresa. E os fundos de pensão — que zelam pelo patrimônio dos aposentados da Caixa Econômica Federal, da Petrobras, do Banco do Brasil — vão perdoar o Dantas. Então o meu problema não é só com a “BrOi”. 

Não sei para que precisa criar essa “BrOi”. Não sei como é que a “BrOi” vai competir, por exemplo, nos Estados Unidos, na Alemanha, na Argentina. Não vai chegar nem na Bolívia porque está atrasada em dez anos. Mas tudo isso é um problema técnico. E estou falando do problema político. O quê que é a “BrOi”? A “BrOi” é o seguinte — o governo Lula vai esconder o Dantas debaixo do tapete. Ponto, ponto! Isso é um acordo político importantíssimo. E ninguém diz nada. 

Todo mundo fica achando que sou maluco, que eu tenho mania de perseguição, que eu tenho idéia fixa, que eu sou o Juquinha, que só penso naquilo. Não, não, meu! O Daniel Dantas é o herói da privatização do (governo) Fernando Henrique. E ele roubou a Brasil Telecom — isso segundo a própria Brasil Telecom. 

E o presidente Lula vai pegar dinheiro do BNDES, dinheiro do FAT, e vai dar a dois empresários — o Carlos Jereissati e o Sérgio Andrade —, que não vão botar um tostão. Faço uma proposta pública, eu já disse a todo mundo: vou dar um real além do que eles derem do próprio bolso — e eu quero ser dono da “BrOi”. E entendo muito de telefones, mais do que eles.

Por que o governo Lula…

Por que o governo Lula tem medo do Dantas? Por quê? Sabe por quê? Porque o Dantas comprou uma parte do PT. O governo Lula não pode ir pra cima do Dantas porque não sabe onde vai meter a mão. 

Qual parte do PT o Dantas comprou?

O Delúbio (Soares, ex-tesoureiro do PT), ué! Ele cooptou o (ex-ministro) José Dirceu. O Zé Dirceu trabalha para o Dantas. O Zé Dirceu hoje é o maior de todos os lobistas do país, é a própria Confederação Nacional dos Lobbies. Tem a CNI, tem a CNA e tem a CNL. Tem a Confederação Nacional das Indústrias, a Confederação Nacional da Agricultura e a Confederação Nacional dos Lobbies, que tem como presidente, vice-presidente, secretário-geral e tesoureiro o Zé Dirceu. Ele trabalha para o Dantas! 

Você já escreveu que o Dantas tem aliados no Senado, como o Heráclito Fortes (DEM-PI)…

O Heráclito Fortes é o líder da bancada (pró-Dantas) no Senado. Ele tinha uma preferência: milhagens nos aviões do Dantas. Ele estava colecionando milhas para ir para o Piauí (risos). Quando ele viajava de avião na empresa do Dantas, era para colecionar milhar para ir a Teresina. 

O Dantas é imbatível?

Sim, o Dantas é imbatível, e o governo Lula vai perdoar o Dantas. O presidente de um dos fundos de pensão disse ao meu amigo Rubens Glasberg que fazia o acordo com o Dantas da mesma maneira que a população acuada de uma favela faz acordo com o chefe do tráfico: para poder sobreviver. Que pais é esse? Que governo é esse? E ninguém trata disso! O Mino, eu e o Rubens parecemos três loucos. 

E como uma pessoa consegue montar essa rede?

Vamos fazer as contas de quanto ele ganhou de dinheiro — de quanto levou para casa na Brasil Telecom, no Metrô do Rio, onde ele colecionava e tinha acesso a notas de pequeno valor. Quem é dono do Metrô, assim como quem é dono de empresa de ônibus, coleciona notas de pequeno valor, tá certo? É bom registrar isso. Põe aí no portal Vermelho que o Dantas tinha acesso a notas de pequeno valor! 

Hoje a gente vê um silêncio absoluto na grande mídia sobre isso…

Não, ele é visto como um grande empresário. A (jornalista) Lilian Witte Fibe considera ele um sujeito superdotado de inteligência. O caso da revista Veja não tem nada a ver com admiração, mas com negócios. Segundo o (jornalista) Luis Nassif, ele comprou a Veja. A Veja foi entregue a um conjunto de salteadores. 

É uma coisa mais impregnada, não?

Na Veja, ele comprou no atacado e no varejo. Ele tem uma relação especial com o Roberto Civita (presidente do Grupo Abril). 

O Nassif acredita que isso tem um prazo de validade, que é o segundo semestre deste ano.

O Luis Nassif acha que o Roberto Civita vai degolar eles todos (os jornalistas da Veja sob influência de Dantas). Eu acho que não. Acho que o Roberto Civita vai coroá-los. 

Mas isso tem um preço. Por causa da relação Dantas-Veja, a Abril está acumulando uma dívida enorme, milionária, decorrente de processos por danos morais…

Não tem dívida nenhuma! Eles não perdem na justiça. O Diogo Mainardi (colunista da Veja) acabou de ganhar em primeira instância num processo que movi contra ele no criminal. O Mainardi disse que eu era assalariado do (ex-ministro das Comunicações Luiz) Gushiken. Aí vem o “Gushiken do iG”, o suposto Gushiken, e me demite do iG! Aí eu encaminho a notificação do iG para a juíza e digo: “Excelentíssima senhora juíza, o nexo causal da acusação do Diogo Mainardi contra mim diz que eu era assalariado do PT. Como, se eles me mandaram embora com um pé na bunda?”. 

Não deixaram meu funcionário tirar o crachá, nem a pasta de dente que estava no banheiro, entendeu? E eu sou funcionário do PT? A Justiça deu ganho de causa para ele nesta instância, e eu já recorri. A juíza disse que era uma questão de estilo. Então, vou começar a dizer: “A senhora é uma juíza venal. A senhora vende as suas decisões”. Porque, se é uma questão de estilo, eu posso usar a palavra “venal” como quem usa a palavra “batata-doce”. 

Está tudo louco! Então não tem problema — a Abril não vai cair por aí. E acho o seguinte: o Roberto Civita sabe perfeitamente da trampa que está montada na revista dele. O Roberto Civita tem relações profundas com Daniel Dantas, assim como Dantas tem com a IstoÉ e com a IstoÉ Dinheiro. Profundas, carnais! 

O Leonardo Attuch (editor da IstoÉ Dinheiro) é o homem do Dantas na IstoÉ?

Ele é o chefe de redação do Sistema Dantas de Comunicação. 

O Ali Kamel (diretor-executivo de jornalismo da Rede Globo) tem alguma relação com o Daniel Dantas?

Não, não. Aí é outra coisa. 

Quem é o nome do Dantas na Globo?

Ali ele se vale da omissão. Na Globo, parece que ele não existe. Parece que ele trabalha na Ucrânia — que é um operário ucraniano, um empresário ucraniano.

Sobre esse Márcio Chaer (diretor da revista eletrônica Consultor Jurídico)…

Olha, sobre o Chaer eu não vou querer falar. Porque já demonstrei com documentos extraídos da Brasil Telecom que o Chaer tem uma agência de notícias chamada Consultor Jurídico e uma outra empresa chamada Dublê. Os clientes da Dublê têm, no Consultor Jurídico, um tratamento especial. Em qualquer lugar do mundo, isso se chama conflito de interesse — se não for crime. Então ele é um desqualificado. 

Você acusa o Daniel Dantas de ter grampeado a sua família.

Dantas grampeou a mim, a minha mulher e a minha filha. 

Quando foi isso?

Foi na época da Kroll. Ele utilizou as relações privilegiadas que ele tinha com a Kroll para me grampear. 

E é verdade que você vai até as últimas conseqüências para...

Vou. Eu já disse uma vez que, se ele invadir o inferno, eu me alio ao demônio para pegar ele (risos). 

E será que, uma hora, você pega mesmo (risos)?

Eu espero pegar, mas não sei — aqui no Brasil tudo é possível. Eu, francamente, tenho a impressão de que não vou pegar, mas isso não me desanima. Ele não perde na Justiça. A Polícia Federal já moveu um inquérito contra ele. O Dantas entregou à Veja — e a Veja disse que recebeu do Dantas — os documentos sobre as contas na Suíça do presidente da República, do ministro da Justiça e do chefe da Polícia Federal.

A Polícia Federal abriu um inquérito e pediu o indiciamento do Dantas na Lei de Imprensa. É como pedir o indiciamento do Al Capone (célebre gângster americano da primeira metade do século 20) por dirigir na contramão (risos). A polícia de Chicago chega e diz: “Este rapaz estava embriagado e dirigia na contramão”. Faça-me o favor!

Que responsabilidade tem o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nesse processo de fortalecimento do (banqueiro Daniel) Dantas? Qual é o papel que ele desempenha?

O presidente que fez a privatização dos telefones no México (Carlos Salinas de Gortari) tem um irmão na cadeia e fugiu para a Irlanda. O presidente do Peru que fez a privatização lá (Alberto Fujomori) está preso no Peru. O presidente do Chile que fez a privatização — o insigne general Augusto Pinochet — terminou a vida na cadeia, em prisão domiciliar, por processo de evasão fiscal, lavagem de dinheiro. O presidente que fez a privatização na Argentina (Carlos Menem), se ele vê um policial ou um juiz na rua, sai correndo, muda de calçada. Mas o Fernando Henrique tem a seguinte peculiaridade. Aqui, o Fernando Henrique é o pai da pátria — é o rei do PiG. As pessoas ouvem o Fernando Henrique! Ainda bem que não lêem, porque ninguém consegue lê-lo (risos). Como diz o Mino Carta, você conhece alguém que tenha lido o Fernando Henrique? Algum estudante de Sociologia que tenha lido? E quem é que já leu livro de Economia do Serra? Você conhece? 

Não (risos).
Ninguém, porque ele nunca escreveu. E, no entanto, ele tem a reputação de ser um grande economista. Ninguém sabe de uma tese que ele tenha defendido e que tenha sido original. São dois impostores. O Fernando Henrique desempenha nessa história o papel de ser o cara que fez o processo que criou o Dantas. Foi ele que permitiu que os fundos de pensão fossem entregues ao Daniel Dantas para que ele tomasse conta da telefonia brasileira. E o Dantas entrou na Brasil Telecom e na Telemar também — o que é contra lei.

Um dia, a Previ se deu conta do problema que era ter o Dantas como gestor do dinheiro da Brasil Telecom e trocou a diretoria para destituir o Dantas. O “seu” Nizan Guanaes (publicitário) foi sócio do Dantas nessas ilhas de lavagem de dinheiro. O “seu” Dantas conseguiu uma audiência à noite no Palácio da Alvorada no domingo — e na terça-feira a nova diretoria que destitui o Dantas estava destituída. Só isso! Ele foi ao presidente da República para destituir a diretoria de uma empresa de fundo de pensão, meu. O que você acha?

A irmã do Daniel Dantas financiou com alguns milhões de dólares uma empresa da filha do Serra. Antes da eleição de 2002, o Serra mandou fechar a empresa para não dar problemas na eleição. Eu mostrei os documentos que provam a associação delas em Miami. O Dantas jogou no PSDB e depois jogou no PT com a mesma tecnologia, via Marcos Valério e Zé Dirceu. 

Outro dia, você atacou o Lula no Conversa Afiada por causa dessa tal de Ordem Roberto Marinho…

Ele fez uma coisa muito importante. Tinha uma ordem obscura, inútil, chamada Ordem das Comunicações, que não servia para nada. Ninguém sabia que existia aquela desgraça. Aí o senador Marco Maciel (DEM-PE), que é um iluminado — quando ele acorda pela manhã, o sol brilha com mais intensidade (risos) —, teve a idéia de mudar o nome para Ordem das Comunicações Jornalista Roberto Marinho. É mais ou menos como chamar o Amador Aguiar de bancário, chamar o Antônio Ermírio de Moraes de operário metalúrgico (risos). E o Lula sancionou!

Eu sugeri modestamente que, se o presidente Lula tivesse o ímpeto de dar uma contribuição ao espírito da pátria, mudasse para Ordem das Comunicações Roquete Pinto, que é o pioneiro do rádio brasileiro, da TV pública brasileira — um homem que desbravou a região de Rondônia ao lado do marechal Rondon, que fez um acervo etnográfico e entregou de presente ao Villa-Lobos, um grande brasileiro! Não quis.

Por que não dá ao coronel Dagoberto Rodrigues, o cara que era diretor-geral dos Correios e ficou ali resistindo até o último momento, segurando as informações para passar ao presidente eleito João Goulart, para evitar o golpe de 64? Ou então ao Roberto Rodrigues, brizolista histórico, um homem de caráter. 

Foi o que a (ex-prefeita de São Paulo) Marta Suplicy fez aqui com a Águas Espraiadas, rebatizada para Avenida Jornalista Roberto Marinho. Você, na época, propôs uma homenagem a Vladimir Herzog (jornalista assassinado pelo regime militar).

Claro. Ou Avenida Getúlio Vargas, porque São Paulo é a única metrópole do Brasil que não tem avenida de nome Getúlio Vargas. 

Em compensação, tem um feriado estadual, o 9 de julho, que comemora uma grande derrota para Vargas (risos).

O 9 de julho é o grande momento da história de São Paulo! É como se tivesse na França o Dia de Waterloo (nome da batalha que culminou na derradeira queda de Napoleão Bonaparte). Vamos celebrar Waterloo (risos)! Inacreditável! 

Em qual candidato a presidente você apostaria para 2010?
Eu votaria em Leonel Brizola, que deveria ter sido presidente deste país.

 Você é brizolista?

Não, não… Eu não sou brizolista. 

Você o cita freqüentemente, escreveu um livro muito elogioso ao Brizola…

Sou a favor de provocar, semear a inquietação intelectual, entendeu? É isso que gosto de fazer. Eu fico indignado com o senso comum, com a “pax tucana”, que é uma coisa sombria, medíocre, medíocre, entende? E isso só foi possível porque se criou essa grande salada política, em que foi rolando o PSDB, PT, tudo no mesmo saco, e azeitado pelo dinheiro do Daniel Dantas e os interesses que estão em volta disso. Estou falando também de Sérgio Andrade. Estou falando também do Carlos Jereissati, que é dono de um shopping center e vai ficar dono de 70% da telefonia do país, sem botar um tostão. Por que não eu, que sou presidente da PH Comunicação, uma empresa próspera? Mandei o balanço ao BNDES. Minha situação é mais sólida que a do Carlos Jereissati — e, pelo que ele vai botar, eu também posso ficar com a empresa. 

Você diz que a internet é o último flanco de liberdade de expressão. Mas isso pode prejudicá-lo também, já que você tem o trabalho na Record. Se você convidasse o Serra, por exemplo, para uma entrevista de 15 minutos…

Na Record? Na Record eu não trato dessas coisas…

 E por que não tratar esse assunto na TV?

Porque a TV tem outro perfil, e eu também tenho um outro perfil na Record. Meu perfil na Record é de apresentador e repórter de um programa como o Domingo Espetacular, que não trata de política. As últimas matérias que eu fui fazer foi sobre contrabando no Paraguai, numa diligência da Polícia federal. Isso não tem nada a ver com política. Aqui eu sou repórter de cotidiano, de geral — que é o que eu fiz por anos da minha vida, em Nova York, pelo Fantástico. 

Mas você é um dos poucos contrapontos que temos com espaço na televisão…

Mas é que tem o Paulo e o Henrique. O Paulo trabalha na Record e é um santinho, é uma gracinha (risos). Já o Henrique é um azougue. Só que, quando eu venho para cá, o Henrique não vem — ele fica lá do lado de fora. 

Quem são seus inimigos? Você tem uma lista?

Não, não… Tem alguém que já falou que você conhece as pessoas pelos inimigos que tem. 

E que você mediria seu caráter pelos inimigos…

Isso, que mede o caráter pelos inimigos. Mas eu não tenho inimigos — eu tenho divergências políticas. 

O Daniel Dantas é apenas um “divergente político” seu?

O Dantas, durante muito tempo, me procurou através de vários intermediários — um deles, o (publicitário) Mauro Sales —, para saber por quê que eu falava mal do Dantas. Eu disse: “Não tenho nada a ver com o Dantas”. Depois, quando eu soube que ele grampeou a minha família, passei a ter um problema pessoal. Mas até aí, não tenho nada contra ele. Só queria que ele me desse o nome dos tucanos que compraram cotas do fundo dele mesmo residindo no Brasil. Porque o fundo dele não pode vender cota no Brasil — só pode vender cota no exterior. 

E a ministra Ellen Gracie não deixa mostrar! A ministra Ellen Gracie — essa grande jurista que pretende ser da Corte Internacional de Haia — não deixa abrir o disco rígido que a Polícia Federal apreendeu no banco Opportunity porque ela acha que não há maneira de juntar Banco Opportunity com Daniel Dantas. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Eu costumo dizer o seguinte: é a mesma coisa que você dizer que o Fausto Silva não apresenta o programa do Faustão. O programa do Faustão é apresentado por uma pessoa chamada Fausto Silva que não é o Fausto Silva. Esse é o entendimento dessa grande juíza Ellen Gracie 

Você é um dos jornalistas mais severos com o Supremo. Vira e mexe, critica o Marco Aurélio de Mello…

Marco Aurélio de Mello não é preparado. É a mesma coisa que me convidar para ser ministro do Supremo — eu não posso. Ele é uma pessoa despreparada. Ele é um colunista da Globo. Não é ministro.

No Supremo, quem se salva?

Eu acho formidável que o presidente Lula tenha tido a oportunidade fantástica de renovar o Supremo e nomeou para lá o juiz Carlos Alberto Direito, que não votou a célula-tronco embrionária para não perder e atrasou o processo. A cada dia que ele atrasa o processo, são menos dias de pesquisa para curar o Alzheimer, o diabetes, a Doença de Parkinson. Ele é um católico, ele é da Associação dos Magistrados Católicos. Ele simplesmente não votou. Que vote contra, meu. E quem o nomeou foi o presidente Lula. 

Apesar dessas críticas que você faz ao governo e ao presidente Lula, muitas pessoas o qualificam como “lulista”.

Quê que eu posso fazer? 

Como você quer ser visto?

Eu quero ser visto como um jornalista independente que diz o que pensa — na internet. Aqui (na Record) não. Aqui sou um funcionário do empresário Edir Macedo e estou aqui para trabalhar dentro da política da TV Record. Quero ser conhecido como um repórter de televisão muito bom — porque eu sou um repórter muito bom mesmo, adoro ser repórter de televisão, conceber a matéria, gravar, editar. Eu luto pelas minhas matérias feito um leão na jaula. Isso é uma coisa.

 A outra é o seguinte: quando eu trabalho no meu site — em casa, no telefone, aqui, na madrugada, quando fico com insônia —, aí é outro negócio. Sou um jornalista independente, gosto de provocar as idéias dos outros, gosto de ser do contra, torço pelo mais fraco. Se o cara ganhou, ganhou, ganhou, eu passo a torcer pelo outro. 

É um cricri (risos)…

É, eu gosto de confusão. E eu gosto do Brizola porque o Brizola não ganhava. O Brizola falava assim: "Quando eu sentar naquela cadeira (da Presidência da República), a primeira coisa que farei será contestar aquele monopólio (da Globo)". Qual outro político brasileiro que você já ouviu falar isso? Ninguém diz, meu. 

Você acha mesmo que a Record vai passar a Globo?

Vai! 

Quando? O Hoje em Dia já bate a Globo regularmente…

De manhã, isso já é uma questão ultrapassada. Não se trata mais desse assunto… 

Você acompanha essas negociações da Record — por exemplo, a disputa pela transmissão do Campeonato Brasileiro?

Não. Isso eu não sei nada, não é a minha área. Eu sou apenas um repórter, um apresentador. Acabei de fazer a reunião de pauta. Recebi instrução para fazer duas matérias nesta semana e me reuni com os produtores — já traçamos os rumos. 

E o que o leva a crer que a Record passará a Globo?

A Record está com uma programação boa, com produtos bons. O Domingo Espetacular é um programa muito bom, muito profissional, muito sério. Eu já trabalhei no Fantástico e não vejo nenhuma diferença substantiva entre os atributos tecnológicos ou de pessoal entre a Record e a Globo. Então nós vamos pra cima. 

O processo movido por fiéis da Igreja Universal contra a Folha de S.Paulo e outros jornais…

Ah, eu não posso falar sobre isso. É uma questão que diz respeito à política, que não é da empresa, da TV Record. É da Igreja Universal. 

Mas o Domingo Espetacular fez uma matéria longa, apresentada por você e claramente favorável aos fiéis.

O que eu posso te dizer é o que diz aquela matéria: os fiéis têm o direito de reclamar. Acabou. 

A Globo lançou a campanha do “Q” de qualidade…

A gente está em duvida se é um “Q” de qualidade ou se é um “Q” de queda (risos). Estamos fazendo um estudo profundo aqui. 

Nessa campanha, eles dizem que respeitam a liberdade de expressão…

Sobre isso, sugiro a gente pegar aquela edição do dia que caiu o avião da Gol e que a Globo não deu. Foi o primeiro grande golpe de Estado dado pelo Ali Kamel. Falta o segundo. 

O Nassif tem a tese de que o Ali Kamel…

O Raimundo Rodrigues Pereira é que tem uma tese — de que o Ali Kamel é o Ratzinger da Globo (Ratzinger é o sobrenome de batismo do papa Bento XVI).Ele escreveu um livro para dizer que o Brasil não é racista e que resulta na defesa do nosso modelo de racismo. Interessante — não deixa de ser um malabarismo. 

O Ali Kamel foi o maior beneficiário da morte do Roberto Marinho?

Não, não é nada disso! Não concordo! O negócio é o seguinte: o Roberto Marinho morreu, e os três filhos do Roberto Marinho não têm nome próprio. São conhecidos como “filhos do Roberto Marinho”. São intelectualmente e empresarialmente despreparados. Eles não estudaram, não fizeram curso superior e não dominam língua inglesa — que são atributos necessários para você ser administrador de empresas. 

Então eles inventaram a teoria de que, para ofuscar ou mitigar a sua incompetência, eles iam adotar uma administração profissional — e entregaram a administração de seus negócios a profissionais, entre eles Ali Kamel. Esses profissionais agem na suposição de que fazem aquilo que o patrão queria que eles fizessem. 

Eu mandei importar agora pela Amazon — está chegando aí nas próximas semanas — um livro chamado Right Is Wrong, da jornalista americana (Arianna) Huffington, que defende exatamente esta tese. Na grande imprensa americana, as empresas de jornalismo se despersonalizaram, com raras exceções, e se tornaram grandes negócios, conglomerados de mídia. E aí quem adora as posições antidemocráticas, conservadoras, são os próprios profissionais. São os jornalistas.

Que é também a tese do (jornalista) Mauro Santayana…

Que é, exatamente, a tese do meu amigo Mauro Santayana, com quem eu conversei hoje por uma hora e meia pela manhã. É uma tese perfeita. Você não vê mais um jornalista pobre. Você não vê mais um jornalista de origem humilde. São todos mauricinhos, bonitinhos, cheirosinhos, que querem trabalhar para banco. Nenhum deles tem compromisso com a sociedade. Nenhum deles sabe para que serve ser jornalista numa sociedade democrática.

E para que serve ser jornalista? Para você oferecer uma opinião isenta para que o leitor, espectador ou ouvinte possa decidir, com seus valores, o que quer fazer da vida. Esse valor se perdeu completamente. Nenhum jornalista brasileiro sabe para que serve o jornalismo. É o mesmo que entregar o bisturi a um médico que não sabe para que isso serve. Ele vai pensar que é para fazer as unhas. 

Voltando ao Ali Kamel. Dá para dizer que ele hoje tem mais autonomia na Globo do que, por exemplo, o Alberico de Souza Cruz há uns 20 anos?

Hum…

O Alberico não tinha uma boa sintonia com o Roberto Marinho?

No tempo do Roberto Marinho, era diferente. Nenhum editor tinha autonomia. O Alberico é produto de uma fase de transição em que o doutor Roberto Marinho já estava envelhecido, e ele entrou vendido na eleição do (ex-presidente Fernando) Collor. O Collor foi o terceiro candidato do Roberto Marinho. Os candidatos do Roberto Marinho foram (Orestes) Quércia, (Mário) Covas e depois Collor. 

Quem fez a ligação do Collor com a Globo foi o Alberico. O Roberto Marinho não gostava do Collor porque não gostava do pai do Collor e demitiu o irmão do Collor, o Leopoldo, que trabalhava na Globo de São Paulo. Quando o Collor se tornou inevitável, o Roberto Marinho entrou no vagão dele — no último vagão da composição. 

E o Collor dizia — como disse para mim em Nova York — que não precisou do Roberto Marinho para ser eleito. A relação dele era com o Alberico. Por que foi possível haver isso? Porque o Roberto Marinho estava enfraquecido fisicamente, já estava muito velho e não delegava para os filhos. Os filhos não mandavam nada.

 O Roberto Marinho ainda escondia deles decisões de cunho editorial. Ele dizia para os executivos: “Não conte isso pro João Roberto… Não trate disso com o João Roberto”. Ele entrou vendido. O que ele fez: ele derrubou o Armando (Nogueira) e botou lá uma cara que era de confiança do presidente da Republica também. Agora, não. Agora mudou a qualidade do processo.