Cresce no Congresso debate sobre criação do imposto sobre grandes fortunas

Começa a crescer, no Congresso, um movimento de deputados e senadores para ampliar a discussão sobre a criação de um imposto sobre grandes fortunas a partir do segundo semestre. A medida, que já consta de projeto que tramita no Senado, é tida como uma alternativa para reduzir os efeitos da crise econômica. Parlamentares da base aliada afirmam, em reservado, que a taxação pode contribuir, ao mesmo tempo, para tornar mais justas as medidas referentes ao ajuste fiscal, criticadas por representar perdas para os trabalhadores. E também para evitar outras iniciativas a serem feitas pelo Executivo, tirando recursos do bolso dos cidadãos, diante das sucessivas perdas observadas pelo governo na rejeição de matérias que tinham o objetivo de garantir economias para o Tesouro.

Mas o principal mote é conquistar um pouco da simpatia da população e, ao mesmo tempo, auxiliar o governo na luta para equilibrar as contas, com a referida tributação. Além de reduzir o distanciamento observado hoje entre o Legislativo e o Palácio do Planalto. Distanciamento que pôde ser observado na votação desta semana, no Senado, da medida provisória que aprovou a política de reajuste do salário mínimo e equiparou os valores das aposentadorias à mesma proporção do reajuste.

O resultado foi considerado mais uma perda para o governo e, segundo o Executivo, resultará em problemas para as contas da Previdência Social. Motivo pelo qual tem a perspectiva de veto por parte da presidenta Dilma Rousseff.

“Uma das soluções para toda essa confusão é a taxação de quem possui grande patrimônio”, afirmou, durante reunião em Brasília, recentemente, o presidente da CUT, Vagner Freitas. A CUT tem defendido o estudo de uma proposta sobre esse tipo de imposto há anos e a declaração de Freitas tem sido reiterada desde o início de 2015, quando foram anunciadas as primeiras medidas provisórias referentes ao ajuste.

Também o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) é contundente em relação à questão. “Precisamos taxar o andar de cima”, costuma afirmar em reuniões do seu partido, ao enfatizar que de certa forma já esteja havendo, a seu ver, uma parte dessa tributação, com a proposta de aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSSL) dos bancos, e com a votação do projeto que reduziu a desoneração das empresas.

“Mas temos que ampliar mais”, afirmou Teixeira, ressaltando que isso tem de acontecer em paralelo a estudos como “alteração da meta do superávit, paralisação da elevação da taxa de juros e um amplo programa de proteção do emprego”.

Redistribuição de riquezas

O projeto de lei que aborda o tema e tramita no Senado, apresentado no final de maio pelo senador Paulo Paim (PT-RS), prevê uma contribuição anual dos cidadãos com patrimônio ou herança superior a R$ 50 milhões. E apresenta exceções para a contribuição, como a incidência sobre os bens patrimoniais doados a entidades culturais, educacionais, filantrópicas, religiosas e sindicais, ou reconhecidas como de utilidade pública. De acordo com o parlamentar, o intuito é estimular que bens que o contribuinte detenha apenas como reserva de valor ou mesmo para especulação, sejam destinados a fins filantrópicos.

Outra proposta dentro do projeto de Paim é uma possível redução de todos os tributos patrimoniais pagos pelo declarante, o que retira o argumento de uma possível “dupla tributação”. Igualmente, todas as despesas para a manutenção do patrimônio também poderão ser descontadas, de acordo com o teor do texto apresentado pelo senador.

Paulo Paim afirmou que a ideia do seu projeto é redistribuir a riqueza concentrada em uma restrita parcela da população brasileira. “Vários países importantes o utilizam, e não se compreende a resistência encontrada para sua instituição no Brasil. Essa resistência é, regra geral, escudada em supostos entraves de caráter técnico, que mal conseguem disfarçar o viés político”, destacou. De acordo com contas feitas pelo seu gabinete, a contribuição poderá render até R$ 50 bilhões em arrecadações ao governo.

Critérios variados

Mas os cálculos sobre possíveis efeitos desse novo imposto são os mais diversos. No início do ano, o mestre em Finanças Públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da prefeita Luiza Erundina em São Paulo, Amir Khair, divulgou estudos segundo os quais a taxação dos patrimônios concentrados entre os mais ricos do país poderia vir a render aproximadamente R$ 100 bilhões por ano se aplicada, em uma simulação hipotética, sobre valores superiores R$ 1 milhão. O volume é quase o dobro do estimado por Paulo Paim.

“Quando você tem uma sociedade com má distribuição de riqueza, você tem uma atividade econômica mais frágil. O imposto sobre grandes fortunas teria uma arrecadação semelhante àquela que tinha a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF, que também era chamada de ‘imposto do cheque’). Portanto, bem acima até do ajuste fiscal pretendido pelo governo”, disse o especialista.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) também se debruçou sobre o assunto. A pedido de Gleisi, um grupo de analistas legislativos do Congresso fez um levantamento que constatou, em junho passado, que se fosse aplicado um Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) aos 200 mil contribuintes mais ricos do Brasil, o governo poderia arrecadar até R$ 6 bilhões por ano.

Os números tão diferentes têm uma explicação. As prospecções realizadas abrangem tipos de taxações conforme critérios variados. Todos, no entanto, levam à conclusão de que a cobrança deste tributo começa a ser vista como uma necessidade real no país.

Precisão constitucional

Na prática, esse tipo de imposto está previsto na Constituição de 1988, mas não foi instituído até hoje. Há especulações, não confirmadas, de que a equipe econômica estuda a elaboração de projeto sobre o tema como forma de se antecipar a qualquer decisão do Congresso, para que a taxação – se vier a ser decidida – seja feita de uma forma que não espante o mercado financeiro.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem reiterado que a questão precisa ser tratada dentro do caráter “delicado” que exige, porque pode afastar grandes empresários de fazerem negócios e se fixarem no Brasil, levando-os a preferirem se mudar para outros países. Até porque fatores como transferência de recursos para outros países e imóveis declarados abaixo do mercado, segundo Levy, poderiam diminuir drasticamente o volume a ser arrecadado.

Na América do Sul possuem este tipo de imposto Uruguai, Argentina e Colômbia. E na Europa ocidental, apenas Bélgica, Portugal e Reino Unido não o possuem. Exemplos de taxação bem-sucedida sobre grandes fortunas são observadas hoje no Reino Unido e nos EUA, mas ninguém nega: o assunto é complexo e precisa de ampla discussão.

Fonte: Rede Brasil Atual