O coordenador da FUP fala sobre o imenso prejuízo que a retomada dos leilões de petróleo traz à soberania nacional







Em entrevista ao Portal do Mundo do Trabalho, o coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antonio Moraes, condenou a retomada dos leilões de concessão de petróleo e gás, marcada para 12 de setembro, “cinco dias depois do dia da Pátria”, como “uma agressão à nacionalidade”. “É como se desconhecessem que cada gota deste patrimônio é estratégico para o desenvolvimento desta e das futuras gerações. A retomada dos leilões de petróleo traz imensos prejuízos à soberania nacional”. Na entrevista, Moraes demonstra como o país necessita contar com estruturas públicas, e elogia a postura da BR Distribuidora de enfrentar os abusos do cartel de combustíveis e derrubar o preço a fim de beneficiar o consumidor. Caso a Petrobrás tivesse sido privatizada, como queriam Fernando Henrique, David Zilberstajn e Reichstul Henri Philippe – recém nomeado para ser conselheirodo governo – o estado não teria como intervir, destaca.  “A FUP entrará em campo ao lado dos movimentos sociais para defender o patrimônio dos brasileiros, mobilizando a sociedade contra a alienação das nossas riquezas a meia dúzia de exploradores privados, na sua maioria estrangeiros, que querem se adonar do nosso petróleo”, acrescentou.

Por Leonardo Severo

O que significa esta retomada dos leilões de petróleo e gás num momento em que as grandes potências fomentam guerras e intervenções para dominar as fontes de energia?

 

Pensamos que a retomada dos leilões de petróleo e gás significa um imenso prejuízo à nossa soberania e ao futuro do Brasil enquanto nação. O petróleo é e continuará sendo por décadas um recurso estratégico para o desenvolvimento das nações, portanto não deve ser disponibilizado para interesses privados – principalmente estrangeiros – que têm o lucro em primeiro lugar, colocando em risco o futurodas novas gerações. O fato é que o mundo todo precisa de energia para se desenvolver. Se um país necessita crescer 5%, o consumo de energia terá de ser de 6% e este é um desafio para as nações. Com o desastre ocorrido em Fukushima, no Japão, muitos países como a Alemanha, estão revendo sua política nuclear, o que amplia a procura por petróleo. Ou seja, se já havia necessidade de petróleo e gás, agora ela está ampliada. Então, as nações imperialistas promovem guerras e usam todo o tipo de subterfúgios e alegações para intervir, como ficou demonstrado nas agressões ao Afeganistão, ao Iraque e, mais recentemente, à Líbia. A retomada dos leilões de concessão de petróleo e gás marcada para 12 de setembro, cinco dias depois do dia da Pátria, é uma agressão à nacionalidade.

Uma agressão à nacionalidade…

Exatamente. É como se desconhecessem que cada gota deste patrimônio é estratégico não só para nós, mas para as grandes potências também. As nações imperialistas já demonstraram até onde estão dispostas a ir, e vão à guerra se necessário, para garantir a manutenção dos seus interesses energéticos, do seu padrão de consumo. Este será o 11º leilão de concessão de petróleo e gás, desde a criação da Lei 9.478, em 1997, quando FHC abriu o setor – após ter quebrado o monopólio estatal que era exercido pela Petrobrás – junto com gente como David Zilberstajn e Henri Philippe Reichstul, recém nomeado pelo governo para ser seu “conselheiro”. Graças à nossa luta, não serão licitados blocos do pré-sal, cuja regulamentação ainda não foi concluída, pois aguarda aprovação na Câmara dos Deputados do projeto de lei que trata da partilha dos royalties. No entanto, serão ofertados às multinacionais 174 blocos, dos quais 87 no mar, alguns deles “em águas não rasas”, como disse o ministro Edson Lobão. Ou seja, na chamada franja do pré-sal. Ao todo serão 123 quilômetros quadrados de áreas exploratórias, localizadas no Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará, Bahia, Maranhão, Amapá, Piauí e Pará.

 

Como a FUP vê a nomeação de Reichstul, um privatista empedernido, que até posou para foto ao lado de placa da Petrobrax, que tudo fez para privatizar a empresa, como conselheiro do governo?

 

Este senhor foi colocado pelo governo FHC na presidência da Petrobrás entre 1999 e 2001. Era tamanha a identidade de Reichstul com o projeto privatista de FHC que até os estatutos da Petrobrás foram modificados para que ele pudesse ocupar a presidência. Para ser presidente tinha de ser brasileiro nato e ele tem nacionalidade francesa. É uma figura muito conhecida dos petroleiros, pois dentro do processo de desmonte da empresa, de tudo fez para implantar o arrocho salarial, comandando diversos ataques a direitos, ao mesmo tempo em que promovia uma farta distribuição de bônus  para gerentes, coordenadores e supervisores.  No triste período de três anos em que presidiu a Petrobrás, Reichstul foi um agente do sucateamento e da privatização da estatal, em sintonia com o projeto de demos e tucanos. Em sua ficha corrida está a tentativa de mudança de nome da empresa para Petrobrax, a entrega de 30% da Refap para a Repsol/YPF, o afundamento da P-36 que matou 11 petroleiros, os catastróficos acidentes ambientais na Baía de Guanabara e no rio Iguaçu Paraná, a reestruturação que fragmentou a Petrobrás em 40 unidades autônomas de negócio, entre outras performances de triste memória.

 

Mais do que figura carimbada, um entreguista de carteirinha.

 

Sem dúvida, Reichstul nunca dormiu em serviço quando o que estava em jogo era prejudicar o país. Só não privatizou as FAFENs, a Replan, a Reduc e outras refinarias do Sistema Petrobrás porque os trabalhadores, organizados nacionalmente pela FUP, resistiram com muita mobilização. Após deixar a Petrobrás, Reichstul integrou vários Conselhos de Administração de multinacionais, entre elas a Repsol – a mesma que foi agraciada em sua gestão com ativos da Refap e de blocos de petróleo. Na nossa opinião, é, no mínimo, muita ingenuidade do governo querer ouvir conselhos desse tipo de empresário para controlar e reduzir gastos públicos. Se este senhor ainda fosse o presidente da Petrobrás, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não existiria, pois a estatal jamais investiria no fortalecimento do Estado e em projetos de desenvolvimento nacional. O pré-sal, então, já estaria entregue às multinacionais há muito tempo. Caso tivesse êxito o projeto de FHC, Zilberstajn e Reichstul, hoje o governo não teria como intervir no mercado de combustíveis, pois o Brasil não contaria mais com a Petrobrás Distribuidora, e os consumidores ficariam à mercê da flutuação do mercado internacional e dos interesses gananciosos dos usineiros de álcool.

 

Diante dos reiterados abusos do cartel de combustíveis, a Petrobrás decidiu intervir no mercado e derrubar o preço. Este aumento da participação da estatal na produção do etanol não é uma demonstração inequívoca da necessidade de uma maior participação do estado para evitar novas crises?

 

Ao decidir reduzir o preço de venda da gasolina e do etanol hidratado para os postos revendedores, a Petrobrás Distribuidora age, por determinação do governo, muito corretamente para enfrentar os abusos provocados pelo domínio privado e pela crescente desnacionalização. Assim, a previsão é de que o álcool vai cair 13 % e a gasolina, 6%. Isso só foi possível, como disse anteriormente, porque a BR Distribuidora não foi privatizada e é líder do mercado com sete mil postos em todo o Brasil e 47,8% do volume de combustíveis vendido. Assim, consegue forçar as demais distribuidoras a também reduzir seus preços aos postos e fazer com que esta diminuição seja repassada ao consumidor. É particularmente grave a desnacionalização e a crescente monopolização na produção de álcool e açúcar no Brasil, como exemplifica a compra da brasileira Cosan, maior produtora de açúcar e álcool do mundo, pela multinacional anglo-holandesa Shell. Com o negócio, a Shell passou a deter o controle de etanol, açúcar e energia e o suprimento, além da distribuição e comercialização de combustíveis. Resultado: a Shell passou a controlar aproximadamente 60 milhões de toneladas de capacidade de moagem de cana-de-açúcar por ano, com capacidade de produção de mais de dois bilhões de litros de etanol. O Brasil precisa ter o controle dos setores estratégicos.

 

Focado no mercado interno, o governo Lula decidiu que o grosso das compras da Petrobrás fossem feitas dentro do Brasil, encomendando vários navios e plataformas. Agora, o dono da OGX, Eike Batista, anuncia que vai importar plataformas e navios. O que achas disso?

 

É a lógica de um arquimilionário, de uma das maiores fortunas do mundo: colocar em primeiro lugar os seus interesses, em detrimento do país. Vale lembrar que, durante o governo Lula, a orientação de privilegiar o interesse nacional repercutiu muito favoravelmente na geração de emprego, sendo responsável, só na indústria naval, por cerca de 60 mil novos postos de trabalho aqui dentro, no país. O caso de Eike Batista, que passou a ser dono de poços de petróleo, devido ao governo não ter modificado a lei dos tempos de FHC, é um bom exemplo de como não devemos deixar ao “mercado” a definição de questões que são estratégicas para o desenvolvimento nacional.

 

Quais serão os próximos passos dos petroleiros?

 

A FUP entrará em campo ao lado da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) e os movimentos sociais para defender o patrimônio dos brasileiros, mobilizando a sociedade contra a alienação das nossas riquezas a meia dúzia de exploradores privados, na sua maioria estrangeiros, que querem se adonar do nosso petróleo. Com certeza, a mobilização popular cumprirá um papel fundamental na definição dos rumos do setor.