Aumento do salário mínimo deve ser tratado com excepcionalidade, afirma o presidente da CUT Nacional







Em entrevista ao Vermelho, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, valorizou a unidade das centrais e sua articulação com os movimentos sociais na pressão pelo aprofundamento das mudanças iniciadas no governo Lula, apresentou críticas ao governo Dilma Rousseff e outras ainda mais pesadas ao governo Geraldo Alckmin e falou também do movimento internacional dos trabalhadores.

Qual foi a impressão da CUT do extrato da conversa com o ministro Gilberto Carvalho, que representou o governo federal na reunião que houve com as centrais para debater o salário mínimo?


Primeiro, nós consideramos positivo ter aberto o processo de negociação, era uma reivindicação do conjunto das centrais sindicais, inclusive para pressionar o governo, pois estávamos sabendo das notícias apenas pela imprensa e não havia tido um processo de negociação formal com o governo Lula ou com o governo Dilma, e em espeical com os ministros que estão à frente desse processo. Então eu acho que foi positiva a retomada desse processo de negociação com as centrais sindicais.

Em relação ao conteúdo da reunião, continuamos tendo vários problemas em relação aos temas que estão sendo discutidos. O governo sinalizou positivamente com a manutenção da política de valorização do salário mínimo, o que para nós também é uma política necessária e importante de ser mantida; nós queremos que o Congresso Nacional aprove a política que foi negociada entre o governo e as centrais sindicais até 2023, mas também queremos que o governo Dilma se comprometa com a política de valorização do salário mínimo, e isso foi feito na reunião, sinalizando positivamente.

Só que ao sinalizar positivamente com a política, ela estabelece para 2011 o valor de R$ 545 para o salário mínimo, que é fruto do PIB de 2009. O problema é que nós estamos querendo tratar de forma excepcional 2011, do mesmo jeito que foram tratados de forma excepcional os empresários. Naquele momento de combate à crise, aumentou-se o crédito, diminuíram-se impostos da linha branca, de automóveis, tudo em nome de uma excepcionalidade do momento, em que era preciso fortalecer o mercado interno, aprofundar essas medidas, para que a gente pudesse enfrentar a crise.

 Os bancos também tiveram ajuda?

Os bancos também tiveram ajuda, principalmente pela pressão dos bancos públicos pela liberação do crédito, forçando que os bancos privados também o liberassem. A falta de crédito internacional fez com que os bancos segurassem todo o seu dinheiro no caixa naquele período. As medidas foram corretas, nós inclusive apoiamos várias dessas medidas. Agora, foram excepcionais para enfrentar a crise. Do mesmo jeito, nós queremos tratar o salário mínimo de 2011 como uma excepcionalidade, diante de um PIB que foi negativo por conta dessa crise. Então, da mesma forma como se trataram diversos setores econômicos de forma excepcional, por que não tratar também os trabalhadores? Esse é um ponto que ainda está em discussão, porque não tem acordo. O governo defende, por um lado, a política de valorização do salário mínimo, mas quer manter R$ 545. Nós queremos a política, concordamos que ela é importante, mas não aceitamos os R$ 545. Continua o debate.

Na nossa opinião, tem um outro tema absolutamente fundamental, que é a correção da tabela do Imposto de Renda. O governo se comprometeu, na próxima reunião, a colocar esse como o primeiro ponto de pauta, porque 97% das categorias conquistaram aumentos reais, acima da inflação. Nós tínhamos feito um acordo até 2010, com o governo Lula, de reajustar a tabela em 4,5%, que era o centro da meta da inflação. Agora nós queremos, no mínimo, ter o reajuste e a correção da tabela do Imposto de Renda pela inflação do ano de 2010, que é de 6,47%, e colocamos isso na mesa de negociação. Não dá para uma parte do esforço que os nossos sindicatos fizeram em ter aumentos reais de salário ser agora comido pelo leão[1].

Além de melhorar a condição de vida do trabalhador, de que forma que a valorização do salário mínimo contribui também com o próprio desenvolvimento do país?


O salário mínimo atinge hoje, no Brasil, algo em torno de 49 milhões de brasileiros e brasileiras que dependem direta ou indiretamente dele. Além disso, mais da metade das cidades brasileiras – é um número absolutamente assustador – dependem do valor do salário mínimo para que o seu comércio possa se desenvolver, porque são cidades muito pequenas, onde prevalece, no comércio local, o dinheiro da aposentadoria, dos funcionários públicos daquela região, dos trabalhadores assalariados do setor privado… Então, quando você eleva o salário mínimo, na verdade você tem uma melhoria da renda e da condição não só de quem ganha salário mínimo, mas você melhora um conjunto de ações, do ponto de vista da economia, que inclusive volta para o governo, de forma positiva, através da arrecadação. Quando você tem mais renda da população, mais consumo, o comércio vende mais, a indústria produz mais e isso se transforma numa roda positiva da economia que traz benefícios para o próprio governo em termos de arrecadação de impostos.

Já foi provado, nos oito anos de governo Lula, fruto das marchas da classe trabalhadora, que o salário mínimo, muito menos do que causar inflação, ou quebrar a previdência, ou quebrar vários municípios, transformou-se num poderoso instrumento de distribuição de renda e de combate à crise, fortalecendo o mercado interno. Para quem quer acabar com a miséria, que foi a primeira proposta da Dilma, colocando como prioridade do seu governo acabar com a miséria até 2014, não tem como dar as costas para importância do salário mínimo.

Como o combate à miséria pode se tornar uma política de Estado, sem se restringir a políticas assistencialistas? Como pode ser uma política estratégica em termos do desenvolvimento do país?


Nós temos uma avaliação de que é importante ter como meta combater a pobreza, a miséria, até 2014, mas ter claro de que nós só vamos atingir esta meta de combater a pobreza e a miséria com a implementação, no Brasil, cada vez mais, do Estado como indutor do desenvolvimento, de políticas públicas e sociais que sejam efetivamente para a grande maioria da população brasileira e, principalmente, distribuindo renda. Estamos falando de transferência de renda – bolsa família, previdência social, seguridade social – e também da própria renda dos trabalhadores: à medida que você melhora a situação econômica, isso vai ajudando a atingir essa meta de erradicar a pobreza. Isso tem que se transformar em política de Estado. Quando a gente propõe, por exemplo, a aprovação da legislação do salário mínimo até 2023, que isso seja institucionalizado em lei, é que independe de quem estiver no governo, nós temos que ter a garantia de que o salário mínimo será valorizado ano a ano. Da mesma forma, nós defendemos, por exemplo, a institucionalização de várias políticas públicas e sociais que foram implementadas no governo Lula e que têm que se transformar em políticas de Estado, para que tenham garantia de continuidade.

Já que estamos falando de políticas de Estado e de governo, quais são as principais críticas e as principais pautas que as centrais apresentam nesse início de governo Dilma?


Bom, primeiro em relação às críticas. É lógico que o governo está começando, mas já há uma primeira crítica, que com certeza deve ser feita, a essa visão, que ainda permanece no Brasil e na equipe econômica, de se decidir por manter juros elevados e aumentar a taxa de juros. Há uma visão em parte do governo, na política econômica, no Banco Central, que entende que a inflação tem que ser controlada. O problema é que o Banco Central só a controla através de um mecanismo, de um instrumento, que é taxa de juros. Ninguém quer a volta da inflação, ainda mais nós, trabalhadores, que somos os grandes prejudicados com ela. Nós também queremos inflação baixa, controle do índice. No entanto, o que se estabelece como único mecanismo é a taxa de juros, para reduzir o consumo, a renda, acarretando cortes nos gastos públicos e, com esses mecanismos, você vai estabelecer, lá na frente, a redução dos juros. Nós estamos falando o seguinte: tem que ter uma política monetária que reduza os juros a níveis internacionais. E não é que isso não dá para ser feito sem se levar em conta os instrumentos econômicos. É lógico que dá para ser feito. Em um momento como esse, você estabelecer o aumento da taxa de juros é de novo colocar um obstáculo ao aumento da produtividade, do consumo, da renda, do desenvolvimento do país. Quanto mais você aumenta juros, menos crescimento, menos desenvolvimento você tem. Então, nós avaliamos que essa é uma crítica que tem que ser feita.

Segundo, não dá para continuar tendo uma visão que nós chamamos, aqui na CUT, de visão da agenda derrotada das eleições. Havia uma agenda da redução do papel do Estado, do Estado mínimo, da necessidade de reduzir os gastos públicos, e essa opinião perdeu a eleição, essa era a representação do candidato do PSDB, do DEM. Essa agenda negativa agora tenta se impor ao novo governo, embora nós tenhamos feito todo um debate político durante o processo eleitoral, mostrando que era possível criar uma agenda positiva, continuar crescendo, distribuindo renda, incluindo socialmente e, principalmente, estabelecendo um processo de participação social. Essa é a esperança. A Dilma foi eleita para aprofundar as mudanças iniciadas no governo Lula: crescimento econômico sim, mas tem que ter distribuição de renda. Aliás, não é só crescimento, nós estamos falando de desenvolvimento econômico. Tudo isso é fundamental para a classe trabalhadora no Brasil.

Essas foram as principais pautas da Conclat[3]?

Eu diria que aquele encontro do Pacaembu conseguiu fazer uma assembléia que reuniu cinco das principais centrais sindicais em um processo unitário e importante, onde a pauta e a agenda das centrais sindicais conseguiu ser construída de forma a mostrar para a classe trabalhadora, mas também para a sociedade, que nós também queremos debater a nossa pauta. Então, da mesma forma que os empresários têm canais com o governo, os banqueiros têm canais com vários setores da sociedade, inclusive o governo, nós também queremos discutir, interferir; nós também queremos debater os temas nacionais, não só apresentar uma pauta de reivindicação. Por isso nós estamos colocando, na CUT, como prioridade para o próximo período, por exemplo, o tema da reforma tributária. Não basta a gente discutir só uma pequena parte da questão dos tributos, como por exemplo a desoneração da folha, do jeito que os empresários querem fazer. Eu não quero discutir desoneração da folha, eu quero discutir progressividade dos impostos, pois quem ganha menos tem que pagar menos e quem ganha mais tem que pagar mais, eu não quero debater uma carga tributária sobre o consumo, mas uma carga tributária sobre o patrimônio, sobre a renda, sobre as fortunas. Nós queremos apresentar propostas sobre a reforma tributária e vamos fazer isso agora, no mês de março, no Congresso Nacional.
 

Já foi apresentada aqui a visão das centrais contrária à política de ajuste fiscal combinada com arrocho salarial. Entretanto, embora o auge da crise já tenha passado, agora o Brasil começa a sentir mais seus efeitos, por meio das próprias políticas que vêm sendo implementadas e anunciadas pelo governo federal. Na opinião da CUT, como o governo deveria enfrentar esse momento da crise?


Primeiro, nós consideramos que este continuará sendo um governo em disputa, como foi o governo Lula. Ou seja, é um governo que construiu um processo de alianças para ser eleito, com vários partidos e vários interesses dentro dele. Daí a importância do movimento social e do movimento sindical manter a sua independência, a sua autonomia e continuarem pressionando para que se estabeleça uma correlação de forças junto ao Congresso Nacional, ao governo, e ao Judiciário que favoreça a ampliação das conquistas da classe trabalhadora. Uma coisa é o processo eleitoral, onde se debatem os grandes projetos para o país, onde se debate o que está em jogo na disputa eleitoral. Passada a eleição, a  central sindical precisa saber exatamente qual é o seu papel. O papel do governo é um, o da central é outro, e o do partido é outro. Além disso, a central deve ter uma clareza muito grande da necessidade de pressionar um governo que está em disputa, porque várias pressões vão acontecer dentro dele. É a luta de classes, e os interesses da classe trabalhadora têm que ser garantidos no debate dentro do governo. Para isso tem que ter mobilização, organização sindical e muita pressão, para que a gente avance nas conquistas da classe trabalhadora.

E quais vão ser as estratégias das centrais para tentar sensibilizar o conjunto do povo brasileiro para essas mobilizações, para tentar ganhar milhões de pessoas para essa pressão necessária?


Eu acho que nós temos dois grandes focos, ou duas grandes questões que a CUT está defendendo. A primeira delas é um investimento muito grande em processos e em discussão da nossa comunicação. Como os meios de comunicação, evidentemente, estão concentrados nas mãos de poucos, nós temos que utilizar veículos alternativos, formas alternativas de comunicação, para fazer chegar as nossas lutas, as nossas campanhas e as nossas mobilizações junto aos trabalhadores.

A segunda é articular a agenda e a pauta mais corporativa dos nossos sindicatos, das nossas federações, das nossas confederações, com uma agenda mais geral. Chamar a atenção da sociedade é via comunicação e via mobilização. E essa mobilização, na nossa opinião, tem que ser articulada com o conjunto do movimento social, daí a importância da Coordenação dos Movimentos Sociais, da CMS. E que a gente consiga estabelecer uma pauta comum na CMS, com 10, ou 12, ou 13 pontos. Lógico que nós temos 200 pontos na plataforma da CUT, assim como a CTB, as outras centrais, a UNE [União Nacional dos Estudantes], a Marcha Mundial de Mulheres, todos os movimentos; agora, se cada um for com as suas 200 reivindicações, a gente com certeza vai dissipar toda a possibilidade de construir uma articulação conjunta. A ideia é construir uma pauta comum onde a gente possa estabelecer um processo de mobilização e de negociação para avançar nas conquistas.

E o que tem sido, nos últimos períodos, os principais entraves à mobilização de uma parcela maior da população?


Nós avaliamos que um dos obstáculos é a tentativa de alguns setores de tentar criminalizar os movimentos sociais, o movimento sindical. Por vezes aparecem ações em determinados estados contra o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], ou contra a CUT, contra as centrais sindicais. Morte de dirigentes sindicais ainda acontecem em vários lugares do país, no campo. Ao mesmo tempo, você tem o papel da mídia, ou de parte da mídia, que estabelece uma tentativa de desconstruir a luta dos trabalhadores e do movimento social. A todo momento nós somos tratados como chapa branca, como quem apoiou o governo, foi cooptado por ele; como se o movimento social e o movimento sindical não tivessem resultados concretos da nossa luta cotidiana. Vários deles, inclusive, estão aí: crédito consignado, salário mínimo, convenção 151 da OIT [Organização Internacional do Trabalho], convenção 158, a luta pela jornada de trabalho, tem muita coisa acontecendo pelo Brasil nesses últimos anos, que mostram a importância do movimento sindical e da nossa mobilização. Mas isso não aparece em lugar nenhum. Experimenta alguém falar mal do governo ou jogar um ovo na Dilma em algum lugar. Esse, com certeza, vai aparecer na primeira página. Então nós continuamos tendo esse debate importante que é da democratização dos meios de comunicação, mas, apesar desses obstáculos, temos conseguido construir uma unidade entre as centrais e com os movimentos sociais em geral, para que a gente consiga avançar nesse processo de mobilização e de pressão sobre o governo federal e governos estaduais e municipais.

O movimento social, em especial as centrais, apresentam um nível de mobilização muito consolidado, muito forte nesse início de governo Dilma, até por trazerem uma pauta política bastante forte que veio do governo passado, que é a bandeira da valorização do salário mínimo. Você considera, por outro lado, que houve dificuldade, no início do governo Lula, para os movimentos entenderem o seu papel diante daquela nova conjuntura?


Eu acho que no início do governo Lula, principalmente, em 2003 e 2004, a gente tinha vários companheiros confundido o papel do governo, do movimento sindical e do partido. Inclusive com dúvidas, dizendo: “pô, a gente tinha vários companheiros que saíram aqui do movimento sindical e que agora estão no governo”, ou, do mesmo jeito, companheiros que estavam no movimento sindical e quando assumiam alguma tarefa no governo, diziam: “bom, agora vocês sabem que aqui nós temos um projeto maior e vocês vão entender que não dá para atender a todas as reivindicações”… Aí o pessoal que ficou no sindicato falava: “poxa, mas agora que nós temos um amigo nosso, ou uma amiga, que está lá, nós não vamos conseguir avançar?”. Nós temos que ter claro um pouco daquilo que a gente aprendeu fazendo na prática: uma coisa é o processo eleitoral, como eu disse, a disputa de projetos para o país, o engajamento da população, da militância, dos trabalhadores, nas diferenças de projetos. Outra coisa é a nossa independência e autonomia, e a importância de construir essa articulação e esse fortalecimento da unidade do movimento social para enfrentar os vários interesses de classe que estão colocados no governo federal, nos estaduais, e na sociedade brasileira como um todo. É uma permanente luta de classes. Portanto, independente do que aconteceu no processo eleitoral e da nossa posição, passada a eleição o papel do movimento sindical é a luta pelos interesses da classe trabalhadora, e é assim que nós continuaremos a nossa luta, independente de ter votado nesse ou naquele candidato.

Já que você deu exemplos do movimento internacional, você acredita que as revoltas em curso no Oriente Médio, as mobilizações na Europa – em sua maior parte sindicais, contra as políticas de austeridade, justamente para enfrentar os efeitos da crise – têm impacto nas mobilizações aqui no Brasil?


Eu penso que sim. Lógico que você tem situações diferenciadas entre os países e, mesmo dentro dos países, em que há vários setores, que foram mais ou menos afetados pela crise. Na verdade pelas crises, pois ainda há a questão cambial e a questão ambiental, por exemplo, que é uma questão fundamental – inclusive ano que vem temos o Rio Mais 20 aqui no Brasil. Então toda essa questão das várias crises se apresenta de forma diferente entre os continentes, entre os países e mesmo dentro dos países. O papel do movimento social, do movimento sindical, é construir essa importante unidade para enfrentar isso, com articulações que culminem, por exemplo, com propostas concretas e unitárias no Fórum Social Mundial.

Quando os presidentes se reúnem no G-20, as centrais sindicais têm o papel de apresentar uma pauta positiva. Por exemplo, no auge da crise, conseguimos colocar um debate de que a OIT tinha que participar do G-20, e que o tema do trabalho decente tinha que ser transversal e central no debate deste fórum. Depois, nas últimas reuniões, isso se perdeu, mas vai demonstrando que é preciso ter uma articulação cada vez maior no nível internacional, aliando também às mobilizações, e fazendo com que os governos nacionais façam enfrentamento ao neoliberalismo e a essa visão de que bastaria vender as empresas públicas e deixar o mercado resolver todos os problemas. Esse modelo ruiu, desmoronou, caiu. Então, está em curso o debate, em toda a América Latina, no Brasil, e no mundo inteiro, de que modelo de desenvolvimento nós queremos construir. E nós queremos um modelo que tenha inclusão social, direitos dos trabalhadores, respeito ao meio ambiente, e essas questões todas.

Do global para o local. Foi falado aqui das principais críticas e das principais pautas em relação ao governo federal, da atuação das centrais, do movimento intrnacional dos trabalhadores, mas qual são as principais chagas que 16 anos de governo tucano deixam no estado de São Paulo e quais são os principais avanços que este estado precisa?


Bom, eu diria que, para quem rodou o estado de São Paulo todo, fazendo campanha e articulando um processo de discussão com a população, como nós fizemos, viu o que são 16 anos do governo do PSDB, do governo tucano aqui no estado de São Paulo. Há regiões que deixaram de discutir qualquer tipo de crescimento, de desenvolvimento, para ficarem voltadas, por exemplo, para administrar presídio, pedágio… E eu estou falando em presídios porque aquilo que está no em torno de levar um presídio é uma determinada visão de política de segurança pública, que é um desmonte absoluto do estado de São Paulo e da sua pujança, que a gente sempre teve nos anos anteriores.

Além disso, houve total descaso com as políticas públicas e políticas sociais, principalmente de educação e de saúde, na perspectiva de uma falta de diálogo com o movimento social, de uma truculência no trato com as entidades representativas dos servidores públicos, absolutamente sem diálogo, sem negociação, sem processo de discussão. Some-se um processo de desenvolvimento em que há muitos anos a gente não vê um debate sério no estado de São Paulo sobre futuro, sobre desenvolvimento, sobre planejamento de longo prazo. É uma proposta de “vamos tocando as coisas do jeito que elas vêm, vamos fazendo as coisas do jeito que elas podem ser feitas, e vamos articular com uma parte da mídia para que façam propagandas daquilo que nós estamos fazendo sem mostrar os problemas reais que tem a cidade de São Paulo”. Então, além do tema da educação, a saúde, a questão da violência, são temas fundamentais sobre os quais a gente viu chagas, problemas absolutamente sérios, e que o estado de São Paulo vai ter que enfrentar no próximo período.

Eu espero que essa experiência, que esses anos de tentativa, de ficar martelando a necessidade de conversar, tenham ajudado no sentido de promover uma mudança no próximo período. Essa é uma realidade, não dá para dar as costas ao movimento social, ao movimento sindical, ao diálogo, à negociação. Ninguém está dizendo que vai ter que concordar e fazer acordo, mas o diálogo e a negociação com os atores sociais, com o movimento social, é fundamental, e São Paulo infelizmente pagou o preço esses anos todos por não manter esse diálogo e essa garantia de participação dos trabalhadores.

Qual recado você gostaria de deixar à presidente Dilma Rousseff?

Eu gostaria de dar um recado no sentido de que ela efetivamente aprofunde as mudanças iniciadas no governo Lula, que nós possamos rapidamente sair dessa agenda negativa, que é a agenda dos derrotados da campanha, e entrar em uma agenda positiva, onde a gente discuta efetivamente uma reforma tributária progressiva, uma desoneração de investimento – quem quer investir, gerar emprego e renda, realmente tem que ter desoneração de investimento -, mas, ao mesmo tempo, tem que onerar quem hoje só vive de renda, os rentistas, aqueles que vivem da especulação financeira; enfrentar os grandes interesses que infelizmente ainda estão colocados no Brasil e que não permitem que a gente avance, por exemplo, no limite de propriedade da terra, na questão do campo, na luta pela reforma agrária, na luta pela democratização do acesso à terra. Ao mesmo tempo, que a gente possa estabelecer um processo para atingir o objetivo que ela mesma colocou de erradicar a miséria, ampliando as políticas públicas, as políticas sociais, fortalecendo o Estado como indutor do desenvolvimento, e garantindo que a gente possa ter cada vez mais e melhores empregos, e que o trabalhador brasileiro possa participar cada vez mais da renda nacional, ampliando a melhorando a sua participação nela.

Eu estou absolutamente cansado, e tenho certeza que outros dirigentes também, de ver, todos os anos, revistas especializadas falando do lucro dos bancos, do lucro das empresas, batendo recorde, recorde, recorde… É lógico que os trabalhadores também tiveram importantes conquistas nos últimos anos, mas se você comparar como é que está a distribuição da renda nacional entre o capital e o trabalho, nós ainda temos muito o que avançar em relação ao trabalho ocupar uma fatia cada vez maior dela. Acho que esse é o grande desafio para a gente ter um desenvolvimento justo e solidário nos próximos anos.

Notas:

[1] O leão é o símbolo do Imposto de Renda. No final de 1979, a Secretaria da Receita Federal encomendou uma campanha publicitária para divulgar o Programa Imposto de Renda. Após análise das propostas, foi imaginado o leão como símbolo da ação fiscalizadora da Receita Federal e em especial do imposto de renda. De início, a idéia teve reações diversas, mas, mesmo assim, a campanha foi lançada. A escolha do leão levou em consideração algumas de suas características: 1) É o rei dos animais mas não ataca sem avisar; 2) É justo; 3) É leal;
4) É manso, mas não é bobo. A campanha resultou numa identificação pela opinião pública do leão com a Receita Federal e em especial com o imposto de renda. Embora hoje em dia a Receita Federal não use a figura do leão, a imagem do símbolo ficou guardada na mídia e na mente dos contribuintes.

[2] “ficar de tanga” é uma expressão que significa estar em má situação financeira; arruinado.

[3] Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (Conclat), que reuniu mais de 30 mil pessoas no dia 1º de junho de 2010 no Estádio do Pacaembu (SP), e aprovou a Agenda da Casse Trabalhadora, uma plataforma com vistas à sucessão presidencial. Cinco das seis centrais sindicais registradas no Brasil participaram da Conclat: Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB) e Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST). Apenas da União Geral dos Trabalhadores (UGT) não integrou a mobilização da Conclat em 2010.