Uma carta ao futuro: Nova enciclopédia esmiúça papel da mídia no golpe

Está nas rotativas o segundo volume da Enciclopédia do Golpe. O primeiro foi lançado em novembro. E tratou em diversos artigos e diferentes abordagens de como integrantes do sistema de Justiça, da República de Curitiba às cortes superiores, serviram de alavanca para a deposição da presidenta Dilma Rousseff. E para botar em seu lugar executores de planos de governo que a população brasileira rejeitou sucessivamente nas urnas em todas as eleições presidenciais deste século.

O segundo volume (Editora Praxis) tem como subtítulo O Papel da Mídia, e traz em artigos, ou “verbetes”, métodos, técnicas e estratégias que fizeram dos donos dos meios de comunicação outro alicerce fundamental do golpe de 2016.

A Operação Lava Jato como verdadeira agência de notícias a abastecer o noticiário da mídia comercial. O desempenho orquestrado dos jornais impressos. A fábrica de notícias falsas como forma de induzir a sociedade a apoiar um processo de impeachment. Como atores externos alimentaram essa orquestração. O uso calculado das fotografias, dos telejornais de massa, das capas de revista e das redes sociais. O terrorismo econômico e o abastecimento do fascismo, dos preconceitos e da misoginia. Estas e outras questões que escancaram o papel da imprensa são tratadas em 28 “verbetes” destrinchados por especialistas em diversas áreas de atuação, na imprensa e na política (veja lista de temas e autores no quadro ao final deste texto.)

A publicação é coordenada pelo sociólogo Giovanni Alves, o jurista Wilson Ramos Filho, os jornalistas Maria Inês Nassif e Miguel do Rosário e organizada pela advogada Mírian Gonçalves, ex-vice-prefeita de Curitiba. Autora do prefácio, Maria Inês observa que os brasileiros ainda precisarão de mais alguns anos para entender a complexidade do golpe, mas que a extensão pode ser compreendida rapidamente. “Nos dias seguintes ao golpe, os cidadãos deste país assistiram a uma sucessão de horrores: para cada noite de sono, um dia de pesadelo; para cada noite mal dormida, uma manhã que revelava ao brasileiro médio mais uma conquista perdida, menos um direito”, assinala a jornalista, lembrando dos primeiros “frutos” de um processo resultante dos cenários de justiçamentos e do clima montados para atrair e iludir as massas.

Esta postagem traz logo abaixo, como aperitivos da obra, o prefácio de Maria Inês e a introdução assinada pelo jornalista Mino Carta, diretor da CartaCapital. Os demais verbetes serão oferecidos ao leitor em breve, segundo Maria Inês, em doses semanais – a RBA os publicará tão logo estejam disponíveis. Os autores pretendem expor a debates esses acontecimentos tão contundentes para a história do Brasil e promover uma intensa agenda de lançamentos em diversas capitais e no Fórum Social Mundial, que espera receber 60 mil pessoas de 13 a 19 de março, em Salvador.

Em seu texto, Mino Carta registra que o jornalismo à brasileira sempre serviu à casa-grande, embora nunca de forma tão acintosa conforme se deu depois da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, para atingir o auge da sua ação desinformante desde as manobras contra a reeleição de Dilma Rousseff, que desaguam no golpe de 2016. “Para entender a mídia nativa, é preciso entender o Brasil, desde a fundação da República até os dias de hoje”, explica Mino.

Para ele, os donos da mídia atuam como propagandistas da desgraça e “apostam na resignação e na ignorância do povo brasileiro”. “O jornalismo à brasileira é digno apenas do país da casa-grande e da senzala. Unido no empenho de manter o monstruoso desequilíbrio social, assume-se como antítese da democracia, com o beneplácito agradecido do establishment.”

Além de seu valor como documento político de uma época, Enciclopédia do Golpe – O Papel da Mídia será de grande interesse para leitores, espectadores e internautas entenderem como são feitos os produtos que consomem, para jornalistas, estudantes e historiadores. E para qualquer cidadão desejoso de interpretar com outros olhares o momento pelo qual passa o país sem precisar dos livros de história de amanhã. É uma “carta ao futuro em tempos de horror”, como define Maria Inês Nassif no título de seu prefácio.

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[Via Rede Brasil Atual]