Etchegoyen pode não ser novo. Mas o novo passa por Etchegoyen

Por Normando Rodrigues

Análises de conjuntura centradas em trajetórias pessoais não são análises. Salvo quando a figura em questão encarna o espírito de seu tempo. Se possível, a cavalo, como diria Jorge Guilherme Frederico.

O 2° General Etchegoyen pretende-se o espírito de seu tempo, e pavimenta o curso da História com perseverança. Vejamos. A narrativa seguinte, por incrível que pareça, é toda construída a partir de manchetes de orgãos da imprensa, disponíveis na Internet.

Essa figura anacrônica, sucessivamente promovida por Dilma cada vez que denunciada pela Esquerda, foi o garantidor do Golpe. É dele o “mérito” de ter arrancado do “apolítico” Villas Bôas, o Comandante do Exército, a declaração que viabilizou a votação do impedimento na Câmara: “O EB garantirá o que o Congresso Nacional e o Supremo decidirem.”

Como prêmio, em 15 de maio de 2016 Etchegoyen foi anunciado ministro do Gabinete de Segurança Institucional. Duas semanas depois já declarava a que vinha: listava como uma das maiores ameaças à segurança nacional o MST.

Sua influência cresceu, e passou a dominar politicamente a Polícia Federal, e a disputar a liderança do EB com Villas Bôas.

Em 11 de maio de 17, pouco antes da crise da JBS, Etchegoyen anunciou que teria na manga “medidas extremas” para o combate à violência, e que faria do Rio de Janeiro seu “laboratório”. Gestou-se nesse momento a atual intervenção, que somente não foi posta em prática pelo estouro da denúncia, no dia 17.

A denúncia Joesley/Wesley alcançou Etchegoyen a caminho do Timor Leste. Retornou do meio da viagem de ida, dia 18, e passou a ser o “homem forte” de Temer, como reconhecido por diversas manchetes entre 25 de maio e 25 de junho de 17.

Quando parte do PMDB aliou-se à oposição para requisitar arquivos de imagens do Jaburu, que comprovariam visitas a Temer, o presidente golpista estava paralisado. Quem decidiu o que fazer foi Etchegoyen. Mas não o fez sozinho. Em lugar de convocar juristas, o General consultou quem manda e entende do assunto, reunindo-se com a CIA em 26 de junho de 17. Orientado pela CIA, em 9 de julho Etchegoyen negou a entrega dos arquivos ao Congresso, e ficou por isso mesmo.

No dia seguinte, 10 de julho de 17, um inconformado Rodrigo Maia tentou articular contra Etchegoyen junto a outros generais, e se deparou com a blindagem que nosso pequeno corso tinha armado. Era tarde demais.

Sepultada a crise, o homem forte de Temer se volta contra Lula e, pouco após a condenação do Presidente por Moro, declara que as eleições de 18 podem ser colocadas em risco pelo crime organizado. Guardem essa afirmação, pois se conecta à famosa faixa da Rocinha, mais abaixo citada.

Suas articulações seguiram, tornando-o, de fato, quem manda no Ministério da Justiça – para desgosto do Ministro – e em vários outros órgãos federais, de modo a deixar até o Presidente de fora. Em 24 de outubro de 17 Temer se queixa a Etchegoyen, por desconhecer a última modificação no Plano Nacional de Segurança Pública, anunciado em 3 de outubro e modificado a 19. Foi esta a reunião que deflagrou a crise de saúde que internou o vampiro. Detalhe: a modificação teria sido negociada entre Etchegoyen e o FBI, em reunião de trabalho no dia 9 de outubro de 17.

Em 27 de dezembro, pela 1ª vez, setores do EB manifestam o desejo de ver Etchegoyen Presidente da República. Apesar de envaidecido, nosso personagem, claro, desautoriza as falas. E em 4 de janeiro noticia-se que, meses atrás, o PMDB lhe havia feito convite de filiação, considerando essa mesma possibilidade. Na ocasião, Etchegoyen discreta e polidamente recusou a oferta. Tornaria-se “mais um”.

Em 15 de janeiro de 18 o “capa preta” volta a expressar temor de revolta social, ante a proximidade da condenação de Lula pelo TRF4. A ABIN acompanha o caso, e 2 batalhões de infantaria (1,5 mil homens) entram em prontidão, em Porto Alegre, com outros 7 em estágios diversos de mobilização. O reconhecimento vem logo. Em 20 de janeiro a grande imprensa o saúda como o responsável por tirar o governo das cordas, e retomar a iniciativa política.

FEVEREIRO E A INTERVENÇÃO NO RIO

Resolvido o “problema” Lula com a condenação em 2° grau, observada por uma oposição e sociedade civil anestesiadas e inertes, Etchegoyen retoma seu “laboratório carioca”. Anuncia no dia 2 que o sistema de segurança pública do País está esgotado, e não mais funciona. Prepara-se o terreno.

No dia 11 surge a faixa na entrada da Rocinha, como recado ao STF: “Se prender Lula, o morro vai descer”. Consolida-se o motivo tático. E, além do mais, a esta altura o governo sabe que a Contrarreforma da Previdência não passa antes das eleições, para as quais, aliás, Temer desesperadamente tenta vender sua “simpática” candidatura, sem conseguir enxotar o bando de abutres que pretende ser o 2° presidente do Golpe. Ficam claras as conveniências políticas da intervenção.

Dia 16 surge a intervenção, cuja justificativa, nas palavras de Etchegoyen, foi o “oba-oba” da criminalidade durante o Carnaval. Ante um vacilante General Braga, o interventor, é Etchegoyen quem toma no peito a defesa da medida, e é ele – e não um professor de Constitucional – quem acaba com a polêmica quanto à pretensão de Temer de suspender a intervenção para votar a Contrarreforma da Previdência: “O Decreto não pode ser suspenso.”

Seguem-se declarações contra o Estado de Direito, contra os Direitos Humanos, e a favor de privilégios e isenções legais às tropas, entre os dias 16 e 21. Declarações que tanto miram o eleitorado conservador quanto a consolidação do nome de Etchegoyen nas bases do EB, e que se somam aos mantras reacionários por ele repetidos: “Não houve Golpe de 64, nem Ditadura”; “As Forças Armadas jamais ameaçaram a democracia”; “Os governos militares desenvolveram o País”; “A Reforma da Previdência é essencial”; “As privatizações não ameaçam a soberania nacional”; “No meio militar não há corrupção.”

EM SUMA

Este é o articulador e sustentáculo essencial do Golpe. O nome de um candidato “outsider”, um “gestor eficaz e neutro”, como o de um Pedro Parente, para dar continuidade ao Golpe ungido pelas urnas, passa pela aprovação e cumplicidade deste “espírito de nosso tempo, a cavalo”.

Assim como passa a revista das mochilas escolares de criancinhas, por soldados do Exército.